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A vantagem da associação

A vantagem da associação

Numa época de crise, em que os preços à produção baixaram drasticamente, a Carnalentejana conseguiu manter os valores de venda. É, ainda, um nicho de mercado, que consegue valorizar os seus produtos junto da grande distribuição. A produção é rigorosa. Mas os ganhos compensam.

José Eduardo Gonçalves tem 300 vacas alentejanas puras. Que dão origem, anualmente, a 250 novilhos, vendidos à Carnalentejana, que depois escoa para a grande distribuição. Um nicho de mercado, mas, também, um negócio altamente valorizado. São as premissas que justificam o investimento do produ-tor de Elvas nesta raça de denominação de origem.

Para a produção tem de cumprir um caderno de encargos específicos. Animais filhos de pai e mãe de raça pura alentejana e a utilização, no sistema de recria, de rações previamente estabelecidas. Existem seis rações diferentes para o efeito – para as mães, para os vitelos, para os animais na fase posterior ao desmame, para a fase final de engorda, para as fêmeas de recria e uma de alta energia. Todas elas têm de ser adquiridas via Carnalentejana.

 

O restante da produção é mais ou menos flexível. As mães têm de estar em regime de extensivo, mas, nos novilhos, a opção é do produtor. Certo é que os animais são desmamados aos seis meses e têm de ser abatidos num período que vai dos 16/18 aos 30 meses. Com um intervalo de peso que, em carcaça, é dos 220 aos 400 quilos. Uma variação que facilita a própria gestão da associação. “Temos de ter animais todo o ano e se os animais fossem abatidos todos na mesma altura isso não aconteceria”, explica José Eduardo Gonçalves, também administrador da Carnalentejana. Na associação são abatidos, actual-mente, 120 animais por semana.

A sua exploração envia, para abate, por ano, 125 novilhos machos, mais 30 fêmeas. O peso médio, 325 qui-los/carcaça, um rendimento de cerca de 60% em relação ao peso vivo.

 

Todo o processo está duplamente certificado. Tem uma certificação de produto, realizada pela empre-sa Certis, em colaboração com a Associação dos Criadores de Bovinos da Raça Alentejana. E uma certi-ficação de empresa, através da norma ISO9001.

Cereais indispensáveis

 

Na Herdade Forte do Conde, onde estão concentrados os animais de linha pura alentejana, há pari-ções nove meses por ano. Maio, Junho e Julho são a excepção, por causa do calor e por ser a altura em que há menos alimento disponível para os animais. As fertilidades são satisfatórias. “Parem 80 a 85% das mães, são bons valores dentro do universo das 300 vacas”, salienta José Eduardo Gonçalves.

Na alimentação animal, tem a vantagem de ter uma área alargada de cereais. Onde faz trigo duro, trigo mole, aveia, cevada e triticale. Uma condição que o produtor considera “indispensável” para uma exploração pecuária, pela mais-valia para a alimentação. “O trigo é colhido para grão em Junho, fica a palha, que é enfardada, e o restolho, onde as mães andam cerca de três meses – Julho, Agosto e Setem-bro”, frisa. Como entre Fevereiro e Junho estão no campo, só é necessário dar ração quatro meses por ano. O que permite algumas poupanças na exploração. Tem oito cercas, com 50 hectares cada e os ani-mais permanecem 15 dias em cada uma, em regime extensivo.

 

É associado do agrupamento de produtores Cersul, onde compra todos os produtos para os cereais, desde a semente, ao adubo e aos fitofármacos, e através do qual vende a produção.

Em 2008 apresentou duas candidaturas ao Proder para conversão de alguma área de sequeiro para regadio. Um sistema duplo, de pivot e rega gota-a-gota – para rotação do cereal com o tomate (ver caixa) – que custou, em média, 2500 euros/hectare. Mas com resultados à vista. As produtividades em sequeiro rondam as 2,5?t/ha. No regadio atingem as 4,5?t/ha.

Preços estáveis

Dos 250 novilhos puros de raça alentejana, metade são machos e o restante fêmeas. Na exploração ficam 60 fêmeas para reposição de efectivo. São vendidas 30 novilhas para recria e as outras 30 para a Carnalentejana, juntamente com os 125 machos. A venda de novilhas para recria é um “rendimento importante”, classifica o produtor. E concretiza: “uma novilha vendida como reprodutora vale mil euros, cerca de 30 a 40% acima do valor de abate”.

Mas, na generalidade, os preços pagos pela Carnalentejana são vantajosos. De acordo com José Eduar-do Gonçalves, cerca de 20% acima dos valores de mercado. Em média, 3,70€ por quilo de carcaça. O des-tino, a grande distribuição – Grupo Sonae, Grupo Jerónimo Martins, Grupo Auchan e El Corte Inglés.

Valores que se têm mantido estáveis e mais ou menos imunes à crise do sector. Mas que só são compor-táveis devido à estrutura da Carnalentejana, evidencia o produtor: “se não tivéssemos o negócio das rações, onde temos um poder negocial forte, por comprarmos 1500 toneladas por mês, cerca de 15 ou 20% mais barato do que comprando individualmente, e se não conseguíssemos vender a carne 15 a 20% mais cara, era complicado”.

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É essa força da associação que lhes permite ter um processo totalmente definido. E trabalhar num nicho de mercado como é o da Carnalentejana. O animal é comprado ao produtor, segue para um matadouro em Santarém ou em Sousel. É depois enviado para Torres Novas, onde é feito o desmanche, o embalamento em vácuo e o envio para os postos de venda.

Se, no ano passado, devido às dificuldades do sector, tiveram de controlar a produção, agora estão a controlar as vendas. A tendência é para uma maior procura que oferta, o que permite antever uma possibilidade de aumento de preços.

Cruzados são negócio complementar

A Carnalentejana é apenas uma parte do negócio de pecuária na exploração de José Eduardo Gonçal-ves. Tem ainda uma vertente de animais cruzados. 180 mães alentejanas cruzadas com Charolês, que dão origem a 150 vitelos, e 120 mães cruzadas com Limousine, com 100 crias anuais. Um negócio com cerca de cinco anos, em que os animais são vendidos ao desmame ao fim de seis meses. Opta por não fazer engor-da por uma questão de tesouraria.

Tem algumas vantagens em relação à carne alentejana. O rendimento de animal vivo para carne é de 62%. E está pronto para ir para o matadouro dois meses mais cedo. Mas o valor da carne é cerca de 20% inferior.

Na hora da venda, há duas opções. Através da Carnalentejana, que tem um acordo com o Pingo Doce, para comercialização de vitelos até aos oito meses. Ou através de leilões em Montemor-o-Novo e em Portalegre, uma hipótese cada vez mais apelativa. São animais vendidos logo ao desmame, aos seis meses, e que valem, em média, 2,40€ de peso vivo. São “bons valores”, confessa o produtor, justificados pela fal-ta de novilhos no mercado, o que tem aumentado a procura e, em consequência, os preços.

Suínos para Espanha

A juntar à bovinicultura, José Eduardo Gonçalves investe também, há seis anos, na suinicultura. A partir de um projecto Ruris construiu 400km de novas cercas e depois introduziu os porcos. São 200, de raça pura alentejana, que vende para Espanha. Compra leitões e faz engorda durante 18 meses. Uma for-ma de aproveitar a área de azinheira que tem, onde usa a bolota para os animais. E que permite obter, como o produtor descreve, um “maior rendimento”. Os preços têm vindo a diminuir. O ano passado rondaram os 26/28€ a arroba espanhola e este ano irão ficar-se pelos 22€.

Mas é uma aposta na diversificação da qual José Eduardo Gomes não pretende abdicar. Porque “se tives-se qualquer uma das três explorações isolada iria perder dinheiro”, assegura. O investimento na diver-sificação, na profissionalização e no rigor da gestão são, para o produtor, as características que deverão orientar a sua exploração agora e no futuro. Só assim considera ser possível fazer face à descida de preços e à dificuldade da actividade agrícola e continuar a obter algum valor acrescen-tado na agricultura.

Tomate

“Empatar” este ano, para ganhar no próximo

A propriedade de José Eduardo Gonçalves está direccionada para outras áreas além da pecuária. A produção de tomate é um exemplo. Tem uma área de 40 hectares, em Elvas, já com cerca de dez anos, onde faz 20 hectares anualmente. Mais recentemente apostou num alargamento da cultura. Num novo perímetro de regadio planta entre 70 a 90 hectares anualmente.

As produtividades são bastante boas. Na média dos dez anos, variaram entre as 80 e as 85 toneladas. Os pre-ços de venda têm vindo a diminuir. Através da associação de produtores Altom – Alentejana Tomate, escoa a produção para duas fábricas espanholas. O ano passado os preços foram de 75 euros/tonelada. Este ano, falam numa redução para os 65 euros/tonelada. A razão invocada, adianta José Eduardo Gonçalves, é que “o preço do concentrado de tomate a nível mundial desceu”. Mas, realça ainda, “não desceu tanto quanto irá descer o paga-mento à produção”. São números que tornam difícil a manutenção da cultura. No máximo, permitem um equilíbrio entre os custos e os ganhos.

O produtor vai continuar a investir porque espera que 2011 seja melhor. Para o ano, Espanha irá desligar total-mente as ajudas ao tomate, enquanto Portugal só desliga em 2012 (até lá metade é desligada e o restante man-tém-se ligado à produção). O que, na prática, quer dizer que existem mil euros de apoios que os produtores nacionais irão receber o ano que vem e que os produtores espanhóis já não terão. Motivo que irá, provavelmen-te, levar ao aumento dos preços em 2011. “Por isso, este ano vamos jogar para empatar, com a previsão de ganharmos para o ano”, conclui José Eduardo Gonçalves.