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Agricultura

A reforma da PAC no rescaldo da pandemia

Francisco Avillez
As principais estratégias orientadoras em prol do desenvolvimento sustentável do setor agroalimentar nacional.

Os anos muito difíceis por que iremos passar no rescaldo desta pandemia em que fomos inesperadamente apanhados, vão-nos obrigar a pensar a PAC pós-2020 de uma forma necessariamente diferente daquela que até agora havíamos concebido.

De facto, às justas preocupações com a competitividade futura da nossa agricultura, com uma maior equidade na repartição dos apoios aos produtores agrícolas, com uma gestão mais sustentável dos recursos naturais e com uma contribuição positiva para a neutralidade carbónica e para a coesão económica e social dos territórios rurais, vai ser imperioso acrescentar opções favoráveis a uma maior resiliência da capacidade produtiva instalada e uma maior contribuição para a autossuficiência alimentar.

 

Neste contexto, consideramos ser indispensável que, no Plano Estratégico da PAC (PEPAC), atualmente em elaboração por Portugal, se leve em consideração de forma integrada e coerente o seguinte conjunto de orientações estratégicas.

Primeiro, uma maior equidade na repartição dos apoios aos produtores, que vai exigir, quer um processo de convergência interna total (“flat rate”) dos pagamentos base (PB), quer uma modulação na aplicação dos pagamentos redistributivos (PR) em favor das explorações de menor dimensão. Para minimizar os impactos negativos de uma opção por uma “flat rate” dos PB sobre os rendimentos e a capacidade produtiva das explorações agrícolas mais penalizadas, vai ser necessário, não só aumentar as verbas disponíveis para financiar os PB e PR, como também alterar a composição do sistema de pagamentos ligados à produção (PLP).

 

Segundo, o aumento das verbas disponíveis para financiar os PB e PR poderá vir a ser concretizado, quer através de uma transferência de verbas do 2º para o 1º Pilar, quer através de uma redução das verbas globais a atribuir aos sistemas de PLP. Quanto às transferências de verbas do 2º para o 1º Pilar, admitimos que elas deverão, no mínimo, ser da ordem dos 15% (ver ponto seguinte). No que diz respeito à redução das verbas globais a atribuir aos PLP, propomos que estas resultem de uma eliminação dos prémios às vacas aleitantes e às ovelhas e cabras, eliminação essa que, como veremos à frente, será devidamente compensada por via dos pagamentos associados aos eco regimes.

Terceiro, a transferência de 15% das verbas do 2º para o 1º Pilar, como atrás referimos, que poderá ser obtida pelo desmantelamento de algumas medidas agroambientais (MAA), cujo esvaziamento se tornará inevitável em consequência, quer das novas condicionalidades, quer da introdução de práticas ambientalmente positivas no âmbito dos pagamentos dos eco regimes.

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Quarto, uma redução das verbas a atribuir ao sistema de PLP obtida a partir de uma eliminação dos prémios às vacas aleitantes e às ovelhas e cabras, irá exigir a sua compensação através da adoção de um sistema de pagamentos eco regime prioritariamente orientado para a promoção de sistemas de pastoreio extensivo, capazes de contribuir para um aumento sustentável do teor de matéria orgânica do solo e para a melhoria das respetivas produtividades, capacidade de sequestro de CO2 e de retenção de água pelos solos. O principal objetivo desta profunda alteração nos apoios à pecuária extensiva é de âmbito ambiental e social, e visa substituir apoios à produção de produtos pecuários por apoios aos respetivos sistemas de ocupação e uso do solo, pelos benefícios que poderão vir a garantir para a sustentabilidade dos recursos naturais, para o combate às alterações climáticas, para a promoção de biodiversidade e para a ocupação dos territórios rurais mais fragilizados.

 

Quinto, uma alteração na composição dos sistemas de PLP que se justifica pela necessidade de se vir a contribuir, quer para uma maior resiliência da capacidade produtiva das explorações agrícolas mais penalizadas pelas alterações previstas no contexto da reforma da PAC pós-2020, quer para assegurar uma melhoria do grau de autossuficiência dos produtos alimentares mais sensíveis. Para o efeito, irão ser necessários, não só reforços significativos dos PLP às vacas leiteiras, arroz e tomate para indústria, hoje em dia já apoiados, como também a introdução de apoios adequados aos cereais de outono/inverno e ao milho.

Descarbonização: “Estão proibidas as queimadas extensivas se retira os animais dos territórios o que se produz é deserto”Sexto, um reforço da viabilidade económica dos sistemas de produção vegetal mais penalizados pela adoção da “flat rate” e uma sua indispensável adaptação aos objetivos ambientais e climáticos visados pela PAC pós-2020, o que irá implicar uma afetação de parte dos pagamentos eco regime para a promoção de tecnologias e práticas características das chamadas agriculturas de precisão e de conservação.

Sétimo, uma atribuição aos pagamentos eco regime de uma verba equivalente a 25% do total dos PDP do 1º Pilar, que se considera ser indispensável para que estes pagamentos possam responder de forma eficaz às necessidades de apoio aos sistemas de produção animal e vegetal, anteriormente identificados.
Importa, finalmente, sublinhar que um futuro desenvolvimento sustentável do sector agroalimentar nacional vai implicar, para além do conjunto de orientações estratégicas em causa, um pacote coerente e integrado de medidas complementares no âmbito do reforço das OP e da posição dos produtores agrícolas no contexto da fileira agroalimentar, de medidas eficazes de gestão de riscos e de estabilização de rendimentos e de incentivos adequados à inovação, ao investimento produtivo e à internacionalização.

Artigo publicado originalmente no site da Agro.Ges