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Agroindústria

Apostar na cooperação entre insígnias e marcas

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Apesar de alguns responsáveis de empresas do setor de charcutaria considerarem que o mercado é “maduro”, também é verdade que os consumidores são seletivos, menos fiéis e procuram uma maior relação qualidade/preço. Com produtos presentes nos lares portugueses, o otimismo em relação ao presente ano é notório e para atingir bons resultados a aposta na inovação e na diferenciação é uma constante.

O consumo de produtos do setor de charcutaria tem correspondido nos últimos anos à conjuntura económica do país. A transformação deve-se não só à crise, mas também a uma das suas consequências que daí resultaram e que se prende com a redução dos orçamentos familiares e à redefinição de estratégias de marketing por parte das empresas. Por esse motivo, a opinião de alguns players do setor não é unânime. “O retalho alimentar enfrentou no último ano um anormal período de deflação, com quebras generalizadas nos preços de venda e impacto em toda a cadeia de valor. No entanto, acreditamos que essa tendência tenderá a dissipar-se, visto que a cadeia de valor tem de focar-se mais nas margens de forma a garantir a sustentabilidade dos seus negócios a longo prazo”, explica José Manuel Monteiro, diretor comercial e de marketing do Grupo Montalva.

O mercado português de charcutaria é um “mercado maduro”, onde a tendência é para os consumidores valorizarem ainda mais a relação qualidade/preço. “Tem sido também notório que os clientes estão disponíveis para pagar um pouco mais quando percebem as reais vantagens e benefícios de um determinado produto. O fiambre continua a ser a principal categoria deste mercado, representando cerca de 35% das vendas deste setor, estando presente em mais de 90% dos lares portugueses” salienta Rui Silva, CEO da Nobre.

Destaque também para outros fatores que têm marcado o setor da charcutaria em Portugal, mais precisamente, “o grande desenvolvimento dos formatos de livre serviço, com realce para a explosão dos fatiados, a diversidade de produtos e formatos existente, o grande impulso nas marcas de distribuição, e mais recentemente a afirmação da charcutaria de aves”, acrescenta o diretor comercial da Porminho, Rui Carvalho. A preocupação para os profissionais desta empresa é proporcionar uma oferta “mais eficiente e qualificada, tendo em vista o eixo estratégico e assumindo as suas competências nucleares, as quais foram sendo adquiridas nos produtos cárnicos”. No momento, a Porminho não está focada noutras vertentes de produção alimentar.

Nos dias de hoje, o mercado divide-se em duas grandes tendências de consumo: “uma, em que a variável preço está no topo das prioridades, e outra, em que os benefícios que os produtos oferecem são o principal influenciador da sua decisão de compra”

A adaptação a um novo paradigma de consumo tem-se imposto nos últimos anos também neste setor. Nos dias de hoje, o mercado divide-se em duas grandes tendências de consumo: “uma, em que a variável preço está no topo das prioridades, e outra, em que os benefícios que os produtos oferecem são o principal influenciador da sua decisão de compra”, salienta Miguel Marques, diretor de marketing do Grupo Primor. Nos últimos anos, o consumidor procura mais soluções de consumo verdadeiramente económicas, o que leva as marcas a fazerem um grande esforço por oferecer um preço competitivo “seja por via promocional, pelo formato, ou através de outro tipo de soluções”, acrescenta. Ao mesmo tempo em que impera uma maior racionalidade do consumo, constata-se, “uma maior exigência em relação aos benefícios oferecidos de consumo que coloca no topo das prioridades o preço, alavancando o crescimento de subcategorias de menor valor, onde se encontram produtos como mortadelas, chouriços e fiambres correntes”. Há uma faixa significativa de consumidores – maioritariamente jovens, jovens adultos e consumidores mais informados – que procuram características muito específicas nos produtos que consomem, “transformando a conveniência, o perfil nutricional e o sabor em drivers de consumo. Entre os produtos que respondem a esta necessidade encontram-se os produtos de aves (relevantes pelo seu perfil nutricional), assim como os ‘produtos de sabor’, de perfil mais indulgente (mais regionais, mais delicatessen), e ainda os de conveniência, produtos prontos a cozinhar ou prontos a comer”, diz-nos o representante da Primor.

Também Mário Guarda, administrador da Raporal, considera que o mercado da charcutaria é “um mercado maduro em termos de sortido de produtos”. A diversidade de oferta é enorme e tem-se assistido nos últimos anos “ao crescimento de algumas gamas, nomeadamente, de produtos tradicionais com origem regional, crescimento esse que se deve ao alargamento do sortido de produtos de marca própria da distribuição em detrimento das marcas de fornecedor”.

A relação com a distribuição

A pressão das vendas e da obtenção dos resultados é cada vez maior, o que obriga a novas metodologias e formas de trabalhar para que a cooperação entre as empresas do setor e a distribuição seja a melhor possível. “Admitimos que a relação com a distribuição em 2014, e especialmente no final do ano não foi fácil. Cooperamos tanto para implementar com ações diferenciadoras para as nossas marcas como para desenvolver produtos à medida das necessidades da distribuição”, esclarece José Manuel Monteiro do Grupo Montalva.

Num mercado em constante mudança, o consumidor tornou-se menos fiel e obrigou as empresas a serem mais inovadoras. “A Distribuição tem tido um papel muito ativo, com especial relevo do ponto de vista promocional nos últimos dois anos. São as mudanças que nos permitem crescer e a cultura da Nobre é a de abraçar de forma permanente novos desafios”, sublinha Rui Silva.

Os consumidores também procuram a melhor oferta. Durante cada mês, visitam e compram em lojas de várias insígnias. Para responder a esta mudança, as empresas distribuidoras foram condicionadas “a ter soluções competitivas, de produtos, marcas e apresentações bem como uma dinâmica promocional intensa. Tudo isto fez com que do lado da indústria nos tornássemos mais versáteis, para corresponder às solicitações dos clientes e mais rápidos a responder, percebendo que o negócio é hoje menos estável do que já foi”, afirma Rui Carvalho da Porminho.

A vertente promocional, além da variável preço, também ganhou um protagonismo ímpar, com o qual as empresas das diversas categorias e setores tiveram de aprender a lidar.

A vertente promocional, além da variável preço, também ganhou um protagonismo ímpar, com o qual as empresas das diversas categorias e setores tiveram de aprender a lidar. “A Primor assume que mais do que falar em preço, tem de pensar mais além e criar pontos de convergência que resultem na criação de valor. Os sinais de retoma vão trazer novas exigências e mesmo sabendo que a pressão promocional veio para ficar, acredito que o consumidor vai exigir mais, e a resposta estará na colaboração entre as insígnias de retalho e as marcas”, diz-nos Miguel Marques.

A Raporal adaptou-se às exigências do mercado uma vez que a distribuição é o seu principal cliente. “Registamos algumas relações consolidadas, o que é visível no alargamento do sortido de produtos marca STEC presentes nos lineares. Ainda assim, julgamos importante realçar que a grande concentração na área da Distribuição dificulta as relações, prevalecendo a lei do mais forte”, afirma Mário Guarda.

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Contínua aposta na inovação

Mais do que em lançar novos produtos, em 2014, a Primor esteve concentrada “na consolidação da performance e no aumento da penetração de produtos muito relevantes lançados no segundo semestre de 2013, nomeadamente a Gama Natura, que oferece aos consumidores produtos com menos 50% de sal (quando comparada com os produtos standard), e isentos de alergénicos (glúten e lactose)”. Surge assim uma preocupação com o consumo moderado de sal como prioritário para os portugueses. A Primor alia-se assim às recomendações das organizações internacionais de saúde. “Apostámos em preencher esta lacuna do mercado, desenvolvendo uma gama de produtos com um benefício objetivo e relevante. A credibilidade desta proposta está patente nas chancelas que nos foram atribuídas pela Sociedade Portuguesa de Hipertensão e pela Associação Portuguesa de Celíacos”, avança Miguel Marques.

“Apostámos em preencher esta lacuna do mercado, desenvolvendo uma gama de produtos com um benefício objetivo e relevante.”

No último ano, através da marca STEC, a Raporal lançou uma gama de snacks com as seguintes referências: “Torresmos do Rissol, Torresmos extra e Linguiças Mini, bem como a gama de Processados Picados”. Investiu também na consolidação do sortido de produtos, adaptando o mesmo às necessidades dos consumidores, “através de novas apresentações, designadamente, com o lançamento de produtos fatiados, embalagens adaptadas às necessidades dos clientes e também com novas gramagens adaptadas à procura, no sentido de ir ao encontro das unidoses, cada vez mais procuradas pelo consumidor”, refere Mário Guarda.

As ações de marketing e a presença em suportes de comunicação com impacto junto do público são também parte integrante das estratégias da Porminho. “A marca Porminho adota uma nova assinatura, “Por mim é Porminho”, a qual remete para a ideia de uma marca global de charcutaria ao serviço do consumidor, tendo como valores qualidade, juventude, frescura e modernidade”, explica o diretor comercial.

No seguimento da sua aposta na inovação, o Grupo Montalva apresentou ao mercado, no último ano, “diversas novidades das marcas Izidoro e Damatta. A Izidoro lançou o Fiambre da Perna Superior Grande Seleção, um produto que prima pela autenticidade e sabor, cozido lentamente a vapor o que lhe confere um aroma e sabor de excelência e uma excelente qualidade. Sem fosfatos adicionados, revela-se mais natural, suculento e com uma melhor textura”, afirma José Manuel Monteiro. Com a marca Damatta, foi lançado o Pack Mini Presunto, inspirado nos sabores genuinamente nacionais “Requintado, único e de elevada qualidade, o Mini Presunto Damatta procura que à mesa dos seus consumidores chegue sempre o melhor da charcutaria nacional. As marcas Izidoro e Damatta reforçaram também a sua oferta na área dos fumados/curados/fatiados com o alargamento da gama Sabor Português”, acrescenta o diretor comercial e de marketing. Ao longo dos últimos anos, o Grupo Montalva tem vindo a apostar na inovação, trabalhando diariamente com o objetivo “de desenvolver produtos de valor acrescentado, como a gama de Soja Izidoro Mais Vida. É uma gama ideal para quem se preocupa com a sua alimentação e bem-estar e procura uma alimentação equilibrada e saborosa. Com 0% de Carne, a Gama Soja Izidoro Mais Vida apresenta uma oferta de produtos na área da charcutaria e também da mercearia”, acrescenta.

Também a Nobre procura inovar os seus produtos segundo as preocupações de saúde com os portugueses. Os recentes lançamentos refletiram este posicionamento. “Iniciámos o ano com a melhoria da nossa gama Naturíssimos, com o lançamento das salsichas de frango e peru sem conservantes nem corantes e no segundo semestre apresentámos uma gama totalmente inovadora, a Gama Cuida-t+. Uma gama composta por produtos de charcutaria que aliam sabor a saúde, como por exemplo o Fiambre da Perna Extra, o Peito de Peru Fumado, o Peito de Peru, o Salsichão e o Chourição com teor de sal reduzido e sem glúten. No caso específico do Fiambre da Perna Extra, do Peito de Peru Fumado e do Peito de Peru, estes foram inclusive recomendados pela Federação Portuguesa de Cardiologia, como Escolha Saudável, por terem teor de sal reduzido e baixo teor de gordura, e serem adequados para celíacos e intolerantes à lactose”, afirma Rui Silva.

O que esperar em 2015?

Os resultados alcançados no ano de 2014 permitem à Nobre vislumbrar um ano de 2015 “bastante positivo”. Considerando-se “otimista por natureza, a previsão aponta para um crescimento de 2% no negócio like-for-like, em contraciclo com o mercado mas só possível devido a uma estratégia consolidada e um elevado esforço da empresa em inovar de forma constante”, salienta Rui Silva. O presente ano poderá ainda vir a trazer “um crescimento incremental e extraordinário de mais 20% pela angariação temporária de um negócio do grupo”.

O lançamento de novos produtos e a aposta na inovação faz parte da estratégia das várias empresas. A Porminho planeia desenvolver o seu trabalho com o pressuposto de “continuar a crescer”. Até ao momento, “as variáveis conjunturais não têm afetado a empresa de forma visível pelo que continuamos otimistas”, refere Rui Carvalho.

“As estratégias comerciais têm de estar alinhadas com a adaptação aos hábitos de consumo atuais”

Apesar das poucas certezas do presente ano, os desafios são muitos. A Primor perspetiva um forte crescimento no mercado nacional, fruto da aposta em vários canais onde a empresa não tinha ainda uma presença significativa. “Por outro lado, a Primor continuará empenhada na consolidação da sua posição de liderança na subcategoria bacon (onde Primor é a marca referência do mercado), e na de aves, (na qual detém uma quota já significativa, e que acredita, num futuro próximo, vir a liderar)”, sublinha Miguel Marques. No que respeita ao mercado externo, o caminho é pouco claro, sobretudo devido “à oscilação cambial do euro face a moedas de países onde a Primor tem uma pressão significativa, nomeadamente, Brasil, Rússia e Angola”. Não obstante, a estratégia da empresa passa por consolidar a sua presença naqueles mercados “através de propostas diferenciadoras e que permitam acrescentar valor”.

Para o administrador da Raporal, as expectativas são semelhantes às do ano anterior, ou seja, “um ano de estagnação, eventualmente com alguma redução no volume de vendas, reflexo dos níveis de consumo baixos, fruto da conjuntura económica nacional e internacional. As estratégias comerciais têm de estar alinhadas com a adaptação aos hábitos de consumo atuais”, afirma. O otimismo de outras marcas não é tão visível na Raporal, uma vez que Mário Guarda considera que a crise continuará a afetar o setor, sobretudo no que à política de preços diz respeito, levando a um “esmagamento de margens dos fornecedores, o que provoca uma grande dificuldade para introduzir no mercado produtos de valor acrescentado”. Ainda assim, a empresa acredita no futuro!

Artigo publicado na edição de março de 2015 da revista VIDA RURAL em colaboração com a revista DISTRIBUIÇÃO HOJE