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Os ‘novos’ e as ‘novas’

A chegada de novos empresários agrícolas ao setor está a trazer para a ordem do dia a discussão sobre o potencial de novas culturas, sejam elas completamente ‘importadas’ sejam as tradicionais, mas feitas agora de forma mais intensiva ou profissional. 

Muitas são as críticas sobre a razão porque se deverá apostar em culturas não ‘autóctones’, algumas tropicais, muitas delas com uso intensivo de mão de obra, quando existe tanto por fazer com as nossas culturas tradicionais.

 A discussão é pertinente, mas obriga a usar a memória sobre aquilo que tem sido a evolução da agricultura portuguesa nas últimas décadas. Existiam pomares de pera Rocha ou de kiwis há 30 anos atrás? Produzíamos uva sem grainha ou tomate cereja? Sabíamos o que era baby leaf ou frutos vermelhos para além do morango? A inovação, a procura de novas variedades e de culturas alternativas sempre foram o motor para o desenvolvimento da atividade agrícola. Nisso fomos, e somos, exemplares. Reconvertemos vastas áreas de cereais na região Oeste em fruteiras e vinha. O Ribatejo especializou-se em horto-industriais. O Alentejo tornou-se um dos maiores produtores nacionais de vinho. Fizemos a transição do sequeiro para o regadio, com o que isso implica de tecnologia e conhecimento. Mas a inovação e a procura do novo não é um exclusivo dos novos agricultores. As casas agrícolas mais tradicionais têm sido as grandes impulsionadoras da mudança, com taxas de rotação expressivas e constante experimentação.

 

Se podemos todos começar a produzir mangas e papaias? Não, não podemos, mas há quem o faça, com sucesso, no sul de Portugal, aproveitando uma janela de oportunidade nos mercados nórdicos. Se consigo produzir e ser competitivo, se há mercado, porque não?

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O que não faz sentido é acalentar ‘guerras’ e clivagens entre os que chegam de novo e os agricultores tradicionais. Como já tive oportunidade de dizer em várias ocasiões, na agricultura todos cabem se souberem ocupar o seu lugar com inteligência. O mercado encarregar-se-á de fazer a seleção. Durante muitos anos a queixa era de que a agricultura nacional estava envelhecida e que precisávamos de mais jovens agricultores, mas quando finalmente chegam começam as resistências.

 

Não podemos alimentar o romantismo e o facilitismo, mas os alertas devem ser construtivos e servir para encorajar a fazer bem. A agricultura não é facto para todos, sendo que também não é só para alguns. É para os que souberem agarrar nos projetos com competência (e aqui cabem tantos fatores que dariam para escrever mais uns quantos editoriais).