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Opinião

Reorganização desorganizada dos serviços regionais da agricultura do Continente

Reorganização desorganizada dos serviços regionais da agricultura do continente iStock

O Decreto-Lei 36/2023, de 26 de maio, procedeu à conversão das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional em institutos públicos (CCDR’s, I.P.), com o objetivo de serem transferidas atribuições de serviços periféricos da administração direta e indireta do Estado. Por sua vez, as Portarias n.ºs 407/2023, 405/2023, 404/2023, 406/2023 e 403/2023, de 5 de dezembro, apresentam os estatutos das respetivas CCDR’s, I.P., sendo a ordem indicada para as cinco regiões, de Norte para Sul, e a entrada em vigor com efeitos a 1 de janeiro de 2024.

A partir do suporte legislativo que foi criado, parece que a pretensão seria a descentralização, a desconcentração e deslocalização administrativa para garantir maior coesão e desenvolvimento regional. A pretensão existiu, no entanto, é necessário verificar com cuidado e detalhe como se procurou construir a descentralização e o que está a ser executado.

 

Na construção de qualquer estratégia de descentralização dever-se-á analisar a situação atual e futura, incluindo os respetivos custos (Ribeiro, 2018). A situação atual é determinada pela construção inicial e o percurso realizado. Como se constata na leitura de Bravo & Pinto (2020) para implementar a descentralização também é necessário existir uma adequada estrutura de governança territorial.

Nesta pequena publicação pretende-se analisar a estratégia implementada para os serviços regionais da agricultura do Continente, há mais de quarenta anos a trabalharem de forma descentralizada, considerando o percurso realizado, a situação atual e perspetivas futuras, e também a estrutura de governança. Procura-se assim, como objetivo, verificar e analisar se é possível atingir as vantagens, que foram, teoricamente, identificadas e comunicadas para a descentralização ou, o que efetivamente aconteceu, para a transferência de competências operacionais e, em consequência, colocá-las fora do Ministério da Agricultura e da Alimentação.

 

SERVIÇOS REGIONAIS DA AGRICULTURA NO CONTINENTE

Ao consultar-se o trabalho de Rocha et al. (2021) fica-se a conhecer a história do Ministério da Agricultura a partir de um conjunto de informação e da sua análise, que possibilita obter conhecimento referente à evolução verificada e aos impactos causados no setor agrícola. Constata-se que, após o interregno de 1940 a 1975, ressurgiu um Ministério da Agricultura. Desde o ressurgimento tem sido possível manter a sua existência, apesar de ultimamente constatar-se uma evidente ausência de perceção do valor e contributo ambiental, económico e social do setor. Todavia, com a falta de compreensão e perceção da relevância do setor ao nível dos decisores e da sociedade, acentuada nos últimos anos, se não existir capacidade de decisão para inverter a situação, pode estar em risco a sua existência como Ministério.

 

PERCURSO NAS ÚLTIMAS DÉCADAS

Como etapa marcantes da descentralização dos serviços regionais da agricultura temos o ano 1984 em que os decisores do Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação verificaram que as Direções Regionais de Agricultura não tinham sido institucionalizadas e, por isso, seria necessário estruturá-las para existir uma efetiva descentralização, até considerada, à época, uma “regionalização”. Surgem assim as regiões agrárias e as consequentes zonas agrárias (Rocha et al., 2021). Com esta rede implementada havia um grande objetivo de proximidade ao setor, incluindo competências na extensão à sociedade, à época designada extensão rural. Com maior ou menor entendimento da necessidade de existir proximidade ao setor parece claro e evidente que o objetivo foi continuado até ao fim de 2023.

 

Na extensão rural entrava a formação profissional agrícola e unidades experimentais. Com o início da integração de Portugal na Comunidade Europeia e a inclusão das Pescas, o Ministério passou a designar-se de Agricultura, Pescas e Alimentação e segundo Rocha et al., (2021) com foco na promoção da formação profissional e tecnológica dos agricultores e apoio aos Operadores. Todavia, verificou-se a concentração de competências nos serviços centrais e o insuficiente apetrechamento em recursos humanos das Direções Regionais de Agricultura e a consequente limitação de resposta prestada ao setor (Rocha et al., 2021).

As mudanças foram ocorrendo, sobretudo em resultado das orientações da Comunidade Europeia e das respetivas políticas agrícolas. Na segunda metade da década de noventa do século XX ganha força o próprio conceito de desenvolvimento rural que é integrado na designação do Ministério da Agricultura. Continua a referir-se que as Direções Regionais de Agricultura participariam de forma ativa na definição da política nos domínios da agropecuária e das florestas, incluindo a alimentação.

Na segunda metade da primeira década do século XXI os pensadores e decisores consideraram que a modernização passaria por eliminar a formação profissional e a extensão à sociedade ou, como designada na época, extensão rural. Daqui resulta um corte com a proximidade ao setor agrícola regional.

Para as Direções Regionais, que passaram a ter competências nas Pescas, também incluídas nas suas designações, manteve-se a participação na formulação das políticas, mas, segundo Rocha et al., (2021), foi-lhes atribuída apenas a execução de acordo com as normas e orientações dos serviços centrais.

No período referido no parágrafo anterior ocorre na região Norte a fusão de duas Direções Regionais (Entre-Douro-e-Minho e de Trás-os-Montes) e situação similar se verifica na região Centro (Beira Litoral e Beira Interior). Das fusões indicadas resulta uma Direção Regional de Agricultura e Pescas no Norte e outra Direção Regional no Centro. Simultaneamente, segundo Rocha et al., (2021), suprimem-se as atribuições no âmbito das políticas florestal, cinegética, apícola e aquícola e são integradas as atribuições dos serviços regionais do IFADAP – Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e das Pescas relativamente à análise de projetos de investimento apoiados por fundos públicos e dos pagamentos dos respetivos apoios.

No início da segunda década do presente século seguiu-se o Plano de Redução e Melhoria da Administração Central em que a missão, as atribuições e o tipo de organização interna das Direções Regionais de Agricultura e Pescas foi definida no Decreto Regulamentar n.º 39/2012, de 11 de abril.

Todo este percurso, que se procurou sintetizar, foi acompanhado segundo Rocha et al., (2021) por um decréscimo progressivo do número de recursos humanos, sendo a diminuição da segunda metade da segunda década relativamente à segunda metade da primeira década do século XXI superior a 50%.

Apesar de tudo continuaram a existir as unidades orgânicas desconcentradas, designadas delegações ou serviços regionais, para manterem com maior ou menor dificuldade uma ligação ao setor nas regiões de baixa densidade populacional e, assim, garantirem o grande objetivo de proximidade do serviço público à agricultura, que ainda é o principal setor de dinamização social, económica e ambiental das regiões interiores do Continente.

O ANO DE 2023

Após um percurso construído em quatro décadas direcionado para a descentralização da execução de tarefas atribuídas ou delegadas pelos serviços centrais do Ministério da Agricultura, o ano de 2023 ficou marcado por uma procura de realizar alterações aos serviços regionais da agricultura utilizando-se a justificação da descentralização, desconcentração e desenvolvimento regional.

De acordo com a história dos serviços regionais da agricultura, sintetizada no subcapítulo anterior, facilmente se percebe que a execução de tarefas do setor agrícola já tinha sido descentralizada há muitos anos e, por isso, apenas ocorreu a integração de um Organismo noutro Organismo sem existirem mais competências descentralizadas ou afetas ao novo Organismo.

Facilmente se confirma a inexistência de qualquer alteração à descentralização de execução de tarefas já anteriormente existente com as Direções Regionais quando se identificam as competências de execução que lhes estavam atribuídas e que foram transferidas para as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, Institutos Públicos, identificadas nas Portarias n.ºs 407/2023, 405/2023, 404/2023, 406/2023 e 403/2023, de 5 de dezembro.

Nas políticas agrícolas, que são determinadas pelos acordos estabelecidos no âmbito comunitário e internacional com os Organismos Centrais, nomeadamente o Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral, também não há qualquer intervenção dos serviços regionais. Situações similares ocorrem com outras competências dos Organismos Centrais, como é o exemplo da sanidade vegetal e segurança alimentar em que coordenação está sob a responsabilidade da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária ou na gestão do regadio público que cabe à Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural enquanto Autoridade Nacional do Regadio. Com facilidade se encontram outros exemplos, como as Organizações de Produtores e os seus programas operacionais.

O ano de 2023 fica marcado pela extinção das Direções Regionais de Agricultura e Pescas no Continente suportada por uma ideia de descentralização que, como já foi referido, explicado e justificado, não existiu para os serviços regionais da agricultura.

Fica ainda a ideia de uma gestão regional que poderia otimizar recursos e daí serem obtidos alguns benefícios, o que será analisado nos subcapítulos seguintes e sintetizado nas conclusões e reflexões.

A IMPLEMENTAÇÃO DA REORGANIZAÇÃO DESORGANIZADA

A implementação da reorganização dos serviços regionais da agricultura iniciou-se no começo de 2024 suportada pela legislação criada (Decreto-Lei 36/2023, de 26 de maio) e pelo poder administrativo (Portarias n.ºs 407/2023, 405/2023, 404/2023, 406/2023 e 403/2023, de 5 de dezembro) e, como se constata numa análise ao que está a decorrer sem ter sido efetuada uma apreciação cuidada da génese dos serviços e do seu percurso. Na análise ao que está em curso também se verifica não ter existido, como deveria ocorrer em qualquer reorganização, um estudo e conhecimento quer das competências a executar quer dos recursos disponíveis para realizar as tarefas que garantam a prestação de um serviço aceitável ao setor agrícola.

Se fosse analisada com cuidado a génese dos serviços, o seu percurso e as suas competências haveria alguma probabilidade de ocorrer uma reorganização dos serviços, apesar de já estarem descentralizados, com alguns benefícios organizacionais que permitissem atingir alguns ganhos, sobretudo na eficácia e na qualidade. Quando nada disso é realizado, estamos perante alterações organizacionais desorganizadas com um risco elevado de perda de resposta e capacidade de apoiar o crescimento e desenvolvimento equilibrado do setor agrícola.

As alterações organizacionais desorganizadas constatam-se nas estruturas criadas nas cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, Institutos Públicos. A partir de uma análise rápida verifica-se uma clara diminuição de unidades orgânicas da área da agricultura, sendo mais evidente em algumas CCDR’s, I.P. de regiões de grande dimensão agrícola. De imediato poder-se-á referir que se pretende caminhar para uma racionalização de recursos. Porém, quando se verifica com detalhe o que foi efetuado constata-se que todas as unidades orgânicas das ex-Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional foram mantidas e reforçadas. Conclui-se que não foi a racionalização de recursos e muito menos a análise das competências a executar em função dos recursos a disponibilizar que estiveram associadas à elaboração e implementação da reorganização.

Em geral as ex-CCDR’s apresentavam seis unidades orgânicas fixas (direções de serviços) com unidades flexíveis (divisões) e todas foram mantidas e reforçadas por outros serviços. Adicionam-se ainda as respetivas autoridades de gestão dos programas operacionais. Por sua vez, as ex-DRAP´s possuíam quatro ou cinco (ex-DRAP Norte) unidades fixas com unidades flexíveis. Além da óbvia extinção, que se compreende numa estratégia de racionalização de recursos, da unidade fixa da área administrativa (Direção de Serviços de Administração), ainda foi eliminada mais uma unidade fixa. O mesmo procedimento foi seguido para as unidades flexíveis, em que nas regiões com maior contributo da atividade agrícola a supressão tendeu para um valor aproximado a 40%.

Ao procurarmos uma justificação mais pormenorizada constatamos que há CCDR’s, I.P que não mantiveram unidades orgânicas para o investimento com tarefas de execução ao nível da análise de candidaturas e de pedidos de pagamento resultantes de apoio no âmbito do PEPAContinente e do Mar 2030. Poder-se-á considerar que o apoio ao investimento não tem relevância nessas regiões, só que essas regiões, como é o exemplo do Alentejo, contribuíram com percentagens superiores a 30% e, assim, de forma decisiva para a execução dos respetivos programas nos quadros comunitários anteriores. Daqui resultam duas possibilidades: não houve qualquer relevância atribuída ao setor agrícola no momento de procurar reorganizar os serviços que já estavam descentralizados ou havia um claro desconhecimento dos serviços e das competências a manter e a executar.

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Sabe-se que são os Operadores Económicos que criam valor e o desenvolvimento de qualquer área, no entanto, se não existir uma força conjunta apoiada em conhecimento tácito e explicito, saber fazer, capacidade e organização, as tarefas e as atividades dos Operadores Económicos serão muito difíceis e os resultados penalizados.

Como é evidente, a racionalização de recursos e dos respetivos custos também não parece ter sido sujeita a qualquer reparo ou análise cuidada porque se tivesse ocorrido deveria verificar-se também uma reorganização e consequente decréscimo do número de unidades fixas e flexíveis das ex-CCDR’s. O número de unidades não diminuiu, no entanto, as ex-CCDR’s, em geral, apresentavam valores inferiores aos das ex-DRAP’s no número de competências operacionais e no quadro pessoal. Esta situação é fácil de confirmar nos instrumentos de gestão disponíveis nas páginas das respetivas Entidades.

Apesar da racionalização e dos custos serem componentes a considerar em qualquer reorganização, é necessário quantificar todos os custos e todos os benefícios e para isso tem de existir conhecimento das competências a exercer, do que se pretende executar e dos resultados a atingir no setor. Só com esse conhecimento surgem as decisões equilibradas e o planeamento para o futuro, neste caso concreto dos serviços regionais e nacionais da agricultura e do apoio que devem prestar ao setor de cada região e do Continente.

PERSPETIVAS FUTURAS

Qualquer Instituição sujeita a menor ou maior reorganização deve ter capacidade e ferramentas para responder às solicitações colocadas com eficácia, eficiência e equilíbrio entre receitas e custos. A resposta dada e os resultados atingidos dependem do planeamento estratégico, aplicado com inovação, que é necessária, mas útil e funcional.

Como já foi referido não é a descentralização, mas a reorganização com transferência e partilha de competências nos serviços regionais da agricultura que está em análise e em andamento. Numa primeira fase poder-se-á afirmar que seria determinante identificar quais as funções a desempenhar, e das quais não se pode abdicar. Posteriormente dever-se-ia efetuar o levantamento de processos para identificar as melhores práticas que devem ser aplicadas aos serviços.

Sabemos, como está referido por Costa (2023), que a administração desconcentrada do Estado tem perdido autonomia ou até chegou ao limite de desaparecer. Esta ocorrência caracterizou as ex-Direções Regionais de Agricultura e Pescas.

Apesar do ato eleitoral definido pelo Decreto-Lei 36/2023, de 26 de maio, que será aplicado nas CCDR’s e a passagem a institutos públicos com personalidade jurídica, garantindo, assim, maior autonomia, o que se constata é que continuam a ser poder central, pelo que, como indicam Costa (2023), para já apenas se está perante a transferência e partilha de competências entre Organismos.

Além das competências transferidas ou partilhadas com as CCDR, I.P., não se entende como é que será ultrapassado o funcionamento em unidades setoriais ou subsetoriais do Estado central (Costa, 2023).

A própria OCDE (2019) cit. por Costa (2023) recomendou uma transição gradual, que permitisse um acerto mais cuidado das competências a transferir e a partilhar. Assim, haveria espaço para incorreções e correções, e aprendizagem, permitindo uma maior previsibilidade e reduzindo possíveis paragens no funcionamento e capacidade de resposta do setor público.

Com todas as condicionantes referidas nos parágrafos anteriores, que são claras e evidentes, constata-se que tudo está a decorrer com falta de conhecimento explicito que permitiria planear de forma estratégica a reorganização e tácito, do saber fazer, para consolidar e implementar a nova estrutura com capacidade de, no mínimo, continuar com menos recursos a responder ao setor agrícola.

Quando à diminuição de recursos, que tem caracterizado os serviços regionais da agricultura, se adiciona uma reorganização, designada de descentralização, já efetuada e implementada desde o início dos serviços regionais da agricultura, a tendência será de desorganização, perda de competências e uma probabilidade baixa de obter resultados positivos.

Após esta breve análise conclui-se que as perspetivas futuras para os serviços regionais da agricultura resultantes desta integração não apresentam qualquer indicação ou sinal de elevação dos padrões de qualidade associados à prestação do serviço público. Além disso, também não há obtenção de poupanças com despesas comuns, uma vez que a sua dimensão e a necessidade de existir alguma proximidade ao setor não permite, na maior parte dos casos, associá-los no mesmo local.

Considerando que o conhecimento permite reanalisar e parar qualquer processo construído de forma desequilibrada e, por isso, reduzir perdas e resultados pouco aceitáveis, neste caso até são de serviços públicos, dever-se-á reanalisar a designada transferência de serviços regionais da agricultura para outro Ministério e, assim, minimizar danos futuros. A consequente aplicação do conhecimento e do saber fazer na reavaliação são sempre possíveis, sobretudo na fase inicial em que há poucos danos.

A reanálise permitiria avaliar, repensar e planear a estratégia para os serviços regionais da agricultura do Continente. Para isso dever-se-ia considerar o conhecimento das competências a desempenhar e os recursos a disponibilizar, de forma a evitar perdas e custos a adicionar aos resultantes de fatores abióticos em virtude da agricultura ser uma Ciência da Terra e da Vida.

A propósito de agricultura relembra-se que a sua relevância no Continente é muito maior do que simples indicadores, como o valor acrescentado bruto do setor, podem fazer crer, porque não se avalia a multifuncionalidade e o conjunto de impactos dos produtos transformados e derivados das espécies animais e vegetais, sejam herbáceas ou florestais, e de todas as atividades associadas dos outros setores, secundário e terciário. O conjunto de benefícios contribui muito mais para a dinâmica social, ambiental e económica das regiões e do país do que é comunicado à sociedade devido à falta de conhecimento ou interesse na sua transmissão.

CONCLUSÕES E REFLEXÕES

Como principais conclusões são fáceis de verificar e enumerar as seguintes.

O setor agrícola caracteriza-se por grande relevância em todo o Continente, nomeadamente nas regiões do interior de baixa densidade populacional, especificidade e necessidade de proximidade à execução das atividades, por isso, a existência de serviços regionais com mais de quarenta anos.

A designada pretensão de descentralização dos serviços regionais da agricultura não existiu e até se verifica que foram transferidas competências operacionais para os Organismos centrais, nomeadamente para as Direções-Gerais do atual Ministério da Agricultura e da Alimentação.

Relembra-se que a descentralização tem sido definida com a inclusão das componentes, política, administrativa e financeira, e também se pode adicionar a componente económica.

As políticas agrícolas, que são determinantes na moderna agricultura existente em todos os países e regiões desenvolvidas do mundo atual, continuam a estar na posse dos Organismos centrais sem qualquer intervenção dos serviços regionais.

No caso da agricultura estamos, portanto, perante a partilha e deslocalização de competências para outro Ministério de forma pouco ponderada, pouco avaliada e até desorganizada.

Nota-se assim uma ausência de conhecimento e também não está claro o que se pretende obter e atingir com a reorganização e transferência de competências operacionais para fora do Ministério da Agricultura e da Alimentação.

Conveniência e serviço público orientado para o setor agrícola não se conseguem identificar. Acréscimo qualitativo na prestação de serviço público e racionalização da utilização de recursos e custos não se verificam, porque à redução de unidades orgânicas dos serviços agrícolas correspondeu um acréscimo de outras unidades nas CCDR’s, I.P. e um aumento dos respetivos custos (Portarias n.ºs 407/2023, 405/2023, 404/2023, 406/2023 e 403/2023, de 5 de dezembro; Decreto-Lei n.º 114/2023, de 4 de dezembro; Despacho n.º 12456-A/2023, de 05 de dezembro).

Por último fica uma reflexão. A estrutura organizacional do Ministério da Agricultura e da Alimentação apresenta um Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral com a missão de apoiar a definição das linhas estratégicas, das prioridades e dos objetivos das políticas do Ministério. Com o conhecimento que existe dentro do Ministério, em que se defende, e bem, a sua utilidade para aplicar em qualquer reorganização, transferência e partilha de competências atribuídas aos serviços agrícolas e às regiões onde se pratica efetivamente a agricultura, está justificado o seu uso para repensar e reavaliar as decisões que criaram a ideia de uma descentralização dos serviços regionais da agricultura e das suas competências operacionais, quando já tinha sido efetuada há mais de quatro décadas e durante todo o percurso chegou a ser mais efetiva relativamente ao que se verifica na situação atual devido, por exemplo, a ter existido a prática da extensão ao setor da região, ou seja, a designada extensão rural.

A reflexão anterior tem em consideração que não se entende um Ministério da Agricultura sem serviços regionais nas regiões onde se faz agricultura, sabendo ainda que existe um Ministério da Agricultura em todos os países desenvolvidos e que a produção de alimentos está diretamente relacionada com os conceitos de nutrição e saúde, por isso, a designação tem sido complementada com a inserção de alimentação. Relembra-se ainda que, além da relevância da existência do Ministério da Agricultura para a definição e implementação das políticas agrícolas, temos a grande multifuncionalidade que caracteriza a agricultura em todas dimensões, económica, ambiental e social, e não há ordenamento territorial e coesão bem-sucedidos sem ordenamento agrícola. Facilmente se compreende que na base está a agricultura e só com ela se chega à coesão e ao ordenamento aceitável e não o contrário.