Quantcast
Culturas em Alqueva

As aromáticas de Alqueva

infusões Canteiro da Luz
A Academia das Plantas Aromáticas e Medicinais de Alqueva nasceu para apoiar a produção, transformação e comercialização destas culturas na região. A Vida Rural foi ao Canteiro da Luz, em Mourão, falar com os empresários agrícolas José Rui Lopes e Filipe Lopes, irmãos e parceiros neste projeto que arrancou em 2012.

Quarenta pessoas estiveram reunidas no passado dia 6 de Novembro no Canteiro da Luz, exploração agrícola dedicada à produção de plantas aromáticas e medicinais, no concelho de Mourão, para assistirem às várias etapas pelas quais as plantas passam, desde a produção até ao embalamento. Trata-se da terceira iniciativa do género, organizada pela Academia das Plantas Aromáticas e Medicinais de Alqueva, uma plataforma constituída por quatro parceiros, a EDIA, O CEVRM (Centro de Excelência e Valorização de Recursos Mediterrânicos), o Monte do Pardieiro e o Canteiro da Luz. Segundo José Costa Gomes, director do departamento de planeamento e de economia da água da EDIA, esta Academia nasceu para apoiar a implementação de novos projectos de plantas aromáticas e medicinais nas vertentes da produção, transformação e comercialização.

“De há três anos a esta parte, apercebemo-nos que, o sector das ervas aromáticas e medicinais, começou a despertar interesse em algumas pessoas que, por variadas razões, mostraram vontade em investir na agricultura. No entanto, verificámos que eram pessoas que vinham de outras áreas de formação e, tendo em conta este facto, decidimos criar esta Academia, com um carácter informal, que funciona na casa dos produtores, com o objectivo de estes partilharem experiências e divulgarem estas novas culturas, que constituem uma alternativa interessante a instalar, quando se trata de minifúndio ”, afirma Costa Gomes.

Canteiro da Luz foi o nome escolhido pelos empresários agrícolas, José Rui Lopes e Filipe Lopes, irmãos e parceiros neste projecto que arrancou em 2012.“ Os nossos avós já estavam ligados à agricultura tradicional, sobretudo ao olival e à vinha, e havia alguns terrenos, aqui junto à Aldeia da Luz, nas margens do Alqueva, que não estavam a ser utilizados. Então, pensámos em revitalizá-los, e começámos a visitar explorações de ervas aromáticas em Portugal e em Espanha, uma vez que estas eram culturas que se adequavam à área que tínhamos disponível para implementarmos um projecto e com as quais nos identificávamos”, diz José Rui Lopes, um dos responsáveis pelo Canteiro da Luz. Após o estudo de mercado in loco, nasceu o projecto, apoiado pelo PRODER, ao abrigo da medida “Instalação de Jovens Agricultores”, que resultou num investimento total de 114.000€, cuja despesa elegível, financiada a 60%, cobriu a construção do pavilhão, a instalação das culturas, a aquisição de equipamento, como a tela anti-erva, as linhas de rega, a máquina de corte, o secador e as plantas.

75% da produção é exportada

Dos cinco hectares da parcela, foram utilizados um hectare e meio para a instalação das plantas aromáticas e medicinais. “Por uma questão de gestão eficiente do terreno, o canteiro foi dividido em seis áreas de 2.500 metros quadrados cada”, acrescenta José Rui Lopes, enquanto apanha umas folhas de lúcia-lima para dar a cheirar aos participantes. O canteiro cheira a lúcia-lima, a planta que estão a produzir em maior escala, e a hortelã-pimenta, ambas utilizadas em infusões, a segurelha, planta condimentar, e a sálvia, utilizada em produtos de cosmética, como pastas de dentes. Há relativamente pouco tempo, plantaram estragão francês, uma condimentar muito utilizada na cozinha internacional, que tem um sabor semelhante ao anis.

“No primeiro ano, notámos que tivemos mais pragas. Hoje verificamos que a natureza reagiu, adaptou-se a estas novas culturas plantadas, aqui, neste solo argiloso e, este ano, não tivemos praticamente invasores.”

Apesar de algumas plantas serem mais procuradas no mercado do que outras, José Rui continua a apostar em novas culturas a título experimental, como a stevia, o adoçante do futuro, e o tomilho-limão. Atentos ao que o mercado pede, os sócios do Canteiro da Luz, estão a comercializar com mais facilidade a lúcia-lima e a hortelã-pimenta que segue em seco para um cliente no sul de França. Já a segurelha que, quando foi instalada há dois anos, estava com uma boa cotação no mercado, baixou, pelo que, este ano, no Canteiro da Luz vão fazer apenas um corte. Também estão a vender parte da produção a uma empresa do grupo Nabeiro, e a duas destilarias, a Cobalto Douro e a Sharish Gin. José Rui afirma que 75% da produção é destinada à exportação e 25% absorvida pelo mercado interno.

Após terem cheirado e tocado nas plantas, os participantes assistiram a uma demonstração de corte de lúcia-lima, planta que pode dar entre quatro e cinco cortes por ano, traduzindo-se em cerca de 500 kg por corte, em seco. No camalhão, tapado com uma tela onde foram colocadas duas linhas de rega gota-a-gota, a aromática é plantada de cinquenta em cinquenta centímetros. O corte é feito por uma ceifeira artesanal, inspirada numa máquina utilizada na Nova Zelândia, com assinatura de um engenheiro português. José Rui Lopes explica o procedimento. “ A máquina é constituída por um sistema global automatizado, que integra um par de lâminas à frente, que corta as plantas. A seguir, existe um conjunto de pás frontal, que transporta as plantas para uma tela motorizada até chegarem a um saco que as acumula e que se encontra na parte anterior da máquina. São precisas duas pessoas para empurrarem a máquina, ainda assim, o custo da mão-de-obra reduz drasticamente”.

banner APP

O processo de secagem

Depois do corte, as plantas entram no processo de secagem que pode ser natural, em plataformas situadas dentro do pavilhão, ou no secador híbrido, que funciona a energia eléctrica e solar. A depender das espécies, assim é a duração do processo, que pode demorar entre 24 e 48 horas. No entanto, é importante cortar as plantas o mais secas possível, daí, no dia anterior ao corte, não ser aconselhável a rega. À medida que a planta vai sendo cortada deve entrar rapidamente no processo de secagem para não perder qualidade, que se afere a olho nu, olhando para a cor, para o odor e para a textura da matéria. Tanto a rega gota-a-gota, como o processo de secagem natural, dependem do clima, sendo que normalmente no Canteiro da Luz o sistema de rega, constituído por 18 km de linha, só é activado entre abril e setembro.

José Rui Lopes, um dos responsáveis pelo Canteiro da Luz e as embalagens dos produtos

José Rui Lopes, um dos responsáveis pelo Canteiro da Luz e as embalagens dos produtos

Nos restantes meses do ano, conta-se com a ajuda da natureza. Já a secagem natural também só é possível nos meses com temperaturas mais elevadas. José Rui acrescenta. “Neste momento, apesar deste inesperado verão de São Martinho [reportagem realizada no passado mês de novembro], o processo de secagem natural não resultaria, porque a planta precisaria de estar mais de dois dias nas plataformas e começaria a ganhar fungos e a perder qualidade”. Quando isto acontece, o produto desce na escala de qualidade o que se reflecte directamente no preço pago ao produtor.

Produção vai dobrar

Neste momento, a média do preço pago ao quilo, por planta em seco, ronda os 5 euros. A lúcia-lima é a planta que existe em maior quantidade no Canteiro da Luz, cerca de 60.000 pés, seguida da sálvia, com 30.000 pés e da hortelã-pimenta, que conta com 15.000 plantas. A caminho do segundo ano de produção, os sócios estimam colher o dobro do verificado no ano passado. A curto prazo pensam rentabilizar a área de produção, ou seja, aumentarem a produtividade com os recursos actuais e a médio/longo prazo têm como objectivo aumentar a área de produção, reduzindo alguns custos que fizeram parte do investimento inicial, como a utilização da tela anti-erva. “ Investimos cerca de 7.000 euros em tela e, além da questão económica, a tela, ao tapar o solo, impede a sua fertilização natural, contribuindo para a respectiva degradação nutritiva”, comenta o anfitrião.

No entanto, a tela anti-erva impede que nasçam infestantes, que em modo de produção biológico, não podem ser combatidas com herbicidas. José Rui explica quais têm sido as alternativas utilizadas para evitarem os predadores no Canteiro da Luz. “Utilizamos as barreiras ecológicas, como o absinto e o alecrim, que além de fazerem de bordadura, servem de repelentes, ajudando-nos no combate às pragas. Depois, trabalhamos com insectos auxiliares, como a joaninha e a louva-a-deus, que comem uma das nossas principais pragas, os pulgões. Utilizamos, ainda, os joanários, umas caixas em madeira, colocadas no meio dos camalhões, nas quais introduzimos feromonas que atraem as joaninhas. A ideia é aumentarmos esta população que nos vai ajudar a eliminar o pulgão”. O agricultor é uma espécie de árbitro que deixa a natureza jogar, intervindo o menos possível. Não é aconselhável esterilizar demasiado os ambientes porque vão existir sempre invasores. Por exemplo, com o aparecimento da lagarta que gosta muito das ervas aromáticas, os pássaros começaram a aparecer no Canteiro da Luz para a comerem. A natureza reequilibra-se.

“No primeiro ano, notámos que tivemos mais pragas. Hoje verificamos que a natureza reagiu, adaptou-se a estas novas culturas plantadas, aqui, neste solo argiloso e, este ano, não tivemos praticamente invasores”, afirma o sócio que tenciona continuar a abrir a sua exploração ao público em geral, no sentido de mostrar as boas práticas que fazem do Canteiro da Luz uma exploração de referência na produção de ervas aromáticas e medicinais, marca já presente em algumas lojas gourmet na zona sul do país. A empresa é uma das cinco finalistas da 8ª edição dos Green Project Awards Portugal na categoria “boas práticas em Alqueva”. A cerimónia de entrega dos prémios vai realizar-se no dia 7 de janeiro de 2016, na Culturgest.

Artigo publicado na edição de dezembro de 2015/janeiro de 2016 da revista VIDA RURAL