O bastonário da Ordem dos Médicos Veterinários (OMV), Jorge Cid, ameaçou abandonar o grupo de trabalho de bem-estar animal criado pelo Governo, depois de o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Pedro Matos Fernandes, ter anunciado, na última segunda-feira, já ter escolhido Laurentina Pedroso para o cargo de provedora dos animais.
O grupo de trabalho teria sido incumbido de indicar critérios para a escolha do cargo, contudo, o nome foi revelado sem qualquer consulta ao grupo. O bastonário soube que o convite já teria sido feito em reunião com o ministro do Ambiente e diz que não estar disponível para “show-offs”.
“Fui convocado para uma reunião na última segunda-feira. O senhor ministro do Ambiente pediu-me para reunirmos, para trocarmos impressões, e qual é o meu espanto que apresenta que já tinha convidado para provedora do animal a professora Laurentina Pedroso. O que disse foi que fiquei estupefacto com a notícia, não pela pessoa em si, mas o ter sido nomeada uma pessoa à revelia deste grupo de trabalho, que tinha essa função”, explicou o bastonário.
“Quando o senhor ministro anuncia isto, senti-me ultrapassado. Senti-me eu e, com certeza, os meus colegas de grupo. Portanto, o que eu disse ao senhor ministro foi para se entender com a senhora ministra da Agricultura, porque há descoordenação aqui […]. Pessoalmente, não estou disposto a participar em manobras políticas. Ou há uma intenção séria de tratar estes problemas com a retidão e o tecnicismo que são necessários para esta problemática, ou se querem arranjar medidas políticas e ‘show-offs’, eu não estou disponível.”
Para o bastonário, “o grupo de trabalho [nomeado pelo Ministério da Agricultura] está a ser completamente desvalorizado por outro ministério”.
“Verbas deveriam ser aplicadas à DGAV”
Sobre a transição dos animais de companhia e de pequeno porte para a tutela do Ambiente, Jorge Cid diz-se “contra” e “intransigente” em relação à sua posição.
“Sou completamente contra, porque acho que os animais, num ‘todo’, têm de estar na DGAV [Direção-Geral da Alimentação e Veterinária], que é a autoridade veterinária nacional. O que se deve fazer, e tenho dito isso publicamente, e enviei cartas ao Governo, é que deve ser criado um departamento especifico para o tratamento de toda a problemática dos animais de companhia, dotada de meios humanos e financeiros, desde a contratação de médicos veterinários especialistas na área do bem-estar, saúde pública, etc.”, sugere o bastonário. “O problema é que, ao longo dos anos, tem havido um grande desinvestimento na DGAV, quer em recursos humanos, quer em recursos financeiros e, portanto, fazer omeletes sem ovos é muito difícil.”
“Sou intransigente em que o bem-estar animal e saúde pública têm de ser competência dos médicos veterinários, nunca abrirei mão disso. A saúde e bem-estar animal e saúde pública são da competência dos médicos veterinários, ‘ponto final’”, remata.
O representante da OMV defende que as verbas que vão ser atribuídas ao Ministério do Ambiente para esta problemática – “ficar com os animais de companhia” –, deveriam ser aplicadas à DGAV, por forma a “criar uma estrutura com esse fim”.
Segundo o bastonário, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICFN), que ficou com a pasta dos animais de companhia no seguimento da sua retirada da DGAV, “não tem sequer tradição ou conhecimentos nesta área, tem de ir contratá-los”.
Assim, propõe a manutenção dos assuntos dos pequenos animais na DGAV, especialmente se esta puder contar com a verba que será alocada ao ICNF: “Se há dinheiro para contratar estas pessoas todas para irem para o ICNF, então, invistam também em recursos na DGAV e, então sim, vamos pedir responsabilidades à DGAV, desde que lhes deem condições.”
O responsável critica ainda a atuação do Governo quanto à DGAV nos últimos anos, afirmando que este não tem demonstrado “nenhum interesse […] em investir” na entidade.
“Em vez de investirem numa estrutura que existe, centenária, e dar-lhe meios para desenvolver novas valências, vão criar uma que não tem tradição nem conhecimentos na área. Isto parece-me completamente absurdo”, conclui.
As competências sobre os animais de companhia e animais de pequeno porte passarão para a tutela do Ambiente a partir de 1 de janeiro de 2021.