A Quinta do Cardo, em Figueira de Castelo Rodrigo, tem 180 hectares – sendo 70 hectares de vinha e o restante de floresta – a uma altitude média de 750 metros e está totalmente em Modo de Produção Biológica. “Decidimos apostar na produção biológica porque a região da Beira Interior é propícia, uma vez que não há grandes problemas de clima. O processo de transição teve início em 2009 e terminou em 2014”, explica o enólogo, adiantando que “desde janeiro deste ano que já não temos em mãos nenhum vinho que não seja biológico”.
Luís Leocádio salienta que “os principais problemas na transição [para o bio] foram ao nível da manutenção nutricional da planta, na engenharia da viticultura, com mais trabalho no solo, e mão-de-obra na planta, com mais podas em verde”. Decidiu-se fazer enrelvamento na entrelinha “com espécies que deixem nutrientes no solo, como ervilhaca, fava, ervilha e trevo, sendo que a ervilhaca deu os melhores resultados porque deixa mais azoto no solo e a fava deu-nos alguns problemas em 2016, por ser muito atrativa a doenças como o míldio”.
Sobre a rentabilidade económica da produção biológica, Luís Leocádio explica que “nos primeiros anos houve uma grande quebra da produção, mas com o trabalho no solo nos anos seguintes nesta altura começa a entrar na normalidade”. Conta-nos que a Quinta tem uma parceria com um produtor de ovelhas que lhes fornece o estrume que “depois é curtido também com a matéria resultante da limpeza da nossa área florestal” e adianta que “a perda de rentabilidade é mais pela adaptação ao MPB, mas há que perceber que este é um modo de produção mais arriscado que depende muito da mentalidade e visão da empresa, tendo de se fazer um grande trabalho de formação dos trabalhadores. No início os nossos achavam que queríamos abandonar a quinta”.
O enólogo considera que “está a ser um sucesso em todos os aspetos, sentindo-se muito na qualidade dos vinhos que são muito mais genuínos e têm um caráter mais vincado, mostrando bem o sítio de onde provêm”. A Quinta exporta cerca de 50% da sua produção e com a passagem para biológico “os vinhos ficaram 20 a 30% mais caros, mas o mercado tem aceite bem essa evolução, há cada vez mais mercado para estes vinhos e sentimos que é um trunfo os vinhos serem biológicos”, defende.
Luís Leocádio adianta que a Quinta do Cardo produz cerca de 500 mil garrafas por ano, sendo “o maior produtor nacional de vinho biológico”.
Vinhas biológicas dão mais rentabilidade
Na Fundação Eugénio de Almeida (FEA), o enólogo da Adega da Cartuxa conta-nos que “desde a década de 90 que começámos a introduzir práticas no âmbito da proteção Integrada e em 1999 apostámos na manutenção dos solos com práticas de agricultura sustentável, não mobilizando e usando na entrelinha resíduos da cultura e das infestantes, fomos conseguindo melhorar a matéria orgânica e a fertilidade dos nossos solos”.
Mais para o final da década de 2000, a FEA começa a fazer as primeiras experiências de agricultura biológica “primeiro numa parcela de cinco hectares que mantivemos até 2012 e aí tivemos alguma dificuldade em resolver de forma viável, por exemplo o controlo da erva na linha”, admite Pedro Batista acrescentando que “a sustentabilidade tem de ser também económica e só conseguimos acabar com as ervas à mão, com a enxada”. Explica que foram procurando e acabaram por encontrar um equipamento adequado para o corte das ervas, que funciona com um fio de nylon, em França num pequeno fabricante, curiosamente também ele viticultor em MPB e “assim, desde 2012 até hoje a nossa área de vinha biológica cresceu para 60 hectares e como esse ano coincidiu com o início do caderno de encargos biológico para a vinificação, começámos logo o processo de certificação”. Em setembro de 2016, a FEA apresentou ao mercado os seus dois primeiros vinhos biológicos: o EA branco e tinto de 2015, aproveitando também para lançar a nova imagem da marca.
Mas não parou por aí, “já desde 2010 que começámos também a aplicar os princípios da viticultura biodinâmica”, informa Pedro Batista explicando que “a base de trabalho é a viticultura biológica à qual juntamos os princípios da biodinâmica, nas datas das práticas culturais e com a aplicação dos preparados biodinâmicos, que nos têm dado uma ajuda enorme em relação à melhoria da fertilidade do solo e também pelas hipóteses que abre no combate às pragas”. E garante: “usamos os preparados da biodinâmica há seis anos e são mais eficazes”.
Pedro Batista avança que “estes preparados incluem bosta de vaca e quartzo (sílica), para melhorar e trabalhar o solo, mas também há várias infusões de plantas, que colhemos e secamos, para o combate a pragas e doenças” e garante: “há muita literatura, quer quiser é só procurar e aprender”
A FEA não prevê, todavia, avançar para a certificação em agricultura biodinâmica porque, explica o enólogo, para o fazer teria de ser em toda a área agrícola da Fundação, que ronda hoje os 6.500 hectares, o que seria incomportável, “mas acreditamos que este é o melhor caminho, pelo que tencionamos continuar a aumentar a área em MPB até termos toda a área de vinha em biológico”.
A restante área – a FEA possui 480 hectares de vinha próprios, mais 110 hectares arrendados e ainda compra uva a alguns viticultores da região – está toda em produção integrada e “desde há cinco anos que usamos um software que calcula o estado potencial de infeção da planta e que sugere a percentagem de dose recomendada para aplicar, pelo que tratamos apenas mesmo quando necessário e com uma dose muito pequena face ao indicado pelas empresas”, tendo reduzido em cerca de 30% o uso de produtos químicos.
Na entrelinha a Cartuxa semeia principalmente misturas à base de leguminosas para fixar azoto no solo, para isso precisava de um semeador que permitisse a sementeira direta sem mobilizar o terreno e coubesse na entrelinha, “fomos encontrá-lo na Alsácia construído por um pequeno viticultor, há quatro anos”.
O enólogo afirma que a quebra de produção na transição para o MPB não foi significativa “porque tivemos sempre um cuidado extremo” e diz até que “conseguimos uma maior rentabilidade nas vinhas biológicas do que nas restantes porque os produtos – cobre e enxofre – são muito mais económicos, e os preparados biodinâmicos ainda mais porque somos nós que colhemos”.