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Agroindústria

Flor de sal é ‘produto-estrela’

Salmarim salinas

A Salmarim resulta da paixão de Jorge e de Sandra pela gastronomia e a vontade de proporcionar a cozinheiros profissionais e amadores um produto artesanal de elevada qualidade: a flor de sal. No Sapal de Castro Marim, a empresa apanha também sal grosso, mas a aposta é em produtos premium como a flor de sal aromatizada. Para o futuro os planos incluem o turismo e lazer em torno das salinas artesanais.

O sonho da Salmarim teve início em 2007, mas o sal grosso começou a ser explorado pelo pai da Sandra que vendia a produção por inteiro. Com a Salmarim desenvolveu-se a ligação à gastronomia e os planos são ambiciosos: “Em quatro anos vamos quadruplicar a área, mas não vai ser tudo sal”, afirma Jorge Raiado, “iremos ter áreas de lazer e de interpretação. Vamos desenvolver várias atividades de turismo à volta do sal, sempre em equilíbrio com o meio ambiente”.

A estrutura da empresa mantém-se familiar e o Jorge é a alma da empresa. Recebe-nos no seu ‘uniforme’ de serviço – calções e t-shirt – ao final do dia nas salinas onde, em conjunto com mais dois colaboradores, todos os dias, de maio/junho a setembro, apanha a flor de sal. A simpatia e boa disposição são contagiantes e fica bem claro que o trabalho, duro, é feito com paixão. Aliás, não descansa até colocar apanhadores nas mãos da jornalista e do fotógrafo: “Para sentirem mesmo como é apanhar flor de sal”.

Mas afinal qual é a diferença entre o sal marinho e a flor de sal? E o que faz da flor de sal tão especial?

Jorge Raiado - Salmarim

Jorge responde: “A principal particularidade é a sua textura delicada e seca. A flor de sal é leve e os seus delicados cristais desfazem-se entre os dedos, enquanto o sal é mais húmido e os cristais são resistentes e compactos”. O empresário explica que “o sal grosso marinho é usado para temperar os cozinhados, durante a cozedura, e a flor de sal deve ser adicionada no final em saladas ou outros alimentos cozinhados, para ativar os seus aromas”.

Flor de sal flutua

A conjugação de sol, humidade e vento levam à formação de uma fina camada de flor de sal que flutua na água devido à menor concentração de sódio, enquanto os cristais de sal, mais pesados, se acumulam no fundo das salinas. “Só os melhores dias produzem flor de sal excelente, seca, leve, crocante… e quando o tempo não ajuda, não a colhemos”.

É esta camada que é recolhida por Jorge e os seus colaboradores ao fim da tarde (das 16 h às 20 h), para caixas de plástico onde fica a escorrer e é transportada no dia seguinte de manhã para as eiras de madeira dispostas junto às salinas, onde os flocos ou escamas de flor de sal ficam a secar durante dois a quatro dias, dependendo as condições climáticas. A seguir são colocadas em sacos de ráfia de 14/15 kg, que vão ficando mais pesados e no final da época podem atingir os 17 kg devido à maior concentração de minerais, pelo que “usamos estes sacos para fazer a flor de sal aromatizada”, explica o produtor. Os sacos são colocados no armazém perto das salinas e transportados de oito em oito ou de 15 em 15 dias para a unidade de transformação e embalamento em Vila Real de Santo António, em instalações alugadas à Docapesca, onde trabalha uma pessoa, e onde Jorge desenvolve os novos produtos.

A Salmarim tem 36 talhos de onde retira anualmente cerca de 30 toneladas de sal grosso, que vende em embalagens com a marca Salmarim, através de uma parceria com uma submarca, mas principalmente a granel para uma conserveira. “O sal é, normalmente, tirado uma vez em final de julho ou início de agosto”, diz o empresário. O sal é partido com um rodo pequeno de madeira e depois embarachado (puxado para fora da salina) com um rodo mais largo, de nascente para poente, e formam-se umas ‘serras de sal’ que ficam a secar durante cinco dias, em média, sendo depois ensacado na salina e levado para o armazém.

“Se só o sal fosse apanhado daria cerca de 100 toneladas, mas a nossa aposta é a flor de sal”, afirma Jorge Raiado, acrescentando que “cada talho produz num ano médio 75/80 kg de flor de sal por dia e num ano excelente pode chegar aos 140 kg, mas o que procuramos na flor de sal é volume e não peso”, pelo que a produção anual varia entre as quatro e as seis toneladas por ano, dependendo das condições de cada verão.

“Estamos em vias de pedir a Denominação de Origem Protegida para o Sal e a Flor de Sal de Castro Marim, como já foi feito em Tavira, para valorizar ainda mais e assegurar a qualidade do nosso produto.”

A época de apanha vai de junho a setembro, mas as salinas começam a ser preparadas dois meses antes e depois da temporada é necessário ir fazendo manutenção e também apostar na promoção e venda do sal e flor de sal, bem como desenvolver novos produtos.

Os processos de apanha do sal e da flor de sal seguem as regras de produto artesanal para poderem ter a certificação.

Atividade económica dá ‘vida’ ao sapal

Recuando alguns séculos, os romanos e fenícios arrotearam o sapal de Castro Marim, que dista cerca de 8/9 km do mar em linha reta, transformando-o numa zona produtiva de sal. As salinas, divididas em talhos gravitacionais, são privadas e durante séculos foram a base da economia da região. “Depois veio o frigorífico e as salinas não resistiram à concorrência, tendo a atividade decaído muito, com várias salinas a serem abandonadas”, refere Jorge Raiado.

Hoje o sapal é Reserva Natural e ainda tem muitas aves, “mas só existe porque há atividade económica”, frisa. “Há nove produtores, incluindo uma cooperativa, que trabalham quatro marcas comerciais em cerca de 100 talhos em dois conjuntos de salinas e estamos em vias de pedir a Denominação de Origem Protegida para o Sal e a Flor de Sal de Castro Marim, como já foi feito em Tavira, para valorizar ainda mais e assegurar a qualidade do nosso produto”, adianta Jorge Raiado.

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A par das salinas existe também uma empresa de aquicultura que utiliza um sistema não intensivo que trabalha com as marés.

Duplicar a faturação

O produtor conta à VIDA RURAL que “a Salmarim tem vindo a comprar novas salinas, que estavam abandonadas, pelo que vamos aumentar a produção, mas também diversificar as atividades”. No ano passado, a faturação da empresa rondou os 100 mil euros e, este ano, “no primeiro trimestre já duplicou face ao ano passado, pelo que vamos bem encaminhados para duplicar a faturação em 2015 e aumentar o lucro em 2016”, diz, adiantando que “a aposta é também em produtos com mais valor acrescentado, logo mais rentáveis, como a flor de sal fumada e com aromas e os projetos específicos que temos vindo a desenvolver com vários chefs”.

Jorge explica-nos que a Salmarim tem vindo a especializar-se em produtos à medida para vários chefs nacionais, estabelecendo várias parcerias, até com empresas estrangeiras.

flor de sal - Salmarim

Para conhecer melhor as características da flor de sal e perceber quais as melhores condições para a sua formação, Jorge conta-nos que solicitou a colaboração da Universidade do Algarve, que tem tido nos últimos cinco anos. Quando visitámos as salinas estava lá uma doutoranda a recolher amostras para o seu trabalho sobre a flor de sal, com a ajuda de uma estagiária.

A empresa sentiu desde cedo a necessidade de desenvolver produtos não convencionais, daí a aposta na flor de sal e nas suas vertentes fumada ou aromatizada com limão (casca ralada); orégãos e salsa; azeitona e malagueta ou picante (malagueta), vendidos em sacos com zip, dentro de caixas de cartão para garantir as melhores condições de conservação para a flor de sal.

A Salmarim colocou no mercado português a flor de sal fumada, que foi testada/ensaiada nas cozinhas dos chefs Henrique Mouro, Luís Baena, Miguel Rocha Vieira, entre outros, e foi pioneira ao providenciar para o restaurante Tavares pedras de sal, atualmente em serviço no Assinatura, Oceans, Vila Joya, Ferrugem, Taberna 1300, etc.

A empresa colaborou também no desenvolvimento de novos produtos como o chocolate com flor de sal e pimenta branca da Claudio Corallo, os bombons do Francisco Siopa ou selecionando a flor de sal do Arany Caviar (Hungria), com a colaboração do chef Miguel Rocha Vieira (estrela Michelin), bem como nos gelados Santini. E Jorge garante-nos que “há mais produtos em desenvolvimento”.

Cortiça preserva a flor de sal

Uma das principais inovações foi a criação do saleiro de cortiça (em dois tamanhos), onde a flor de sal natural consegue manter as suas características, seca, leve e brilhante. Para dar o toque final a este produto, Jorge convidou o escritor e poeta José Carlos Barros a escrever pequenos textos que acompanham as embalagens de cortiça.

Foram também lançadas embalagens especiais para o aeroporto (tubo de vidro e kit de viagem) e lojas delicatessen (El Corte Inglés, Vida Portuguesa) que são a aposta da empresa, a par dos restaurantes e hotéis de topo. A flor de sal Salmarim já é exportada para a Europa (Espanha, França, Alemanha, Polónia, Suíça, Suécia, Inglaterra, Dinamarca, Bélgica), Canadá e Hong Kong e há também solicitações do Médio Oriente, China e América do Sul.

O canal doméstico é efetuado diretamente pela Salmarim, sendo o canal HoReCa da responsabilidade da Neoquímica, uma empresa especializada e com forte penetração no mercado, mas segmento médio/alto.

A produção da Salmarim é certificada pela SATIVA (Portugal) e Nature & Progrès (França) como produção/produto artesanal. E recorre periodicamente aos Laboratórios da Universidade do Algarve para análises do sal.

Artigo publicado na edição de setembro de 2015 da revista VIDA RURAL