A Gorreana aposta numa produção de qualidade, dirigida a nichos de mercado, baseada nas características únicas do seu chá: produzido sem químicos, sustentável social e ambientalmente. Agora vai inovar com misturas com óleos essenciais e ervas aromáticas. “Queremos apostar cada vez mais nos mercados mais exigentes, como o alemão, por isso vamos aumentar a área de produção em mais cinco hectares, de Orange Pekoe, o nosso topo de gama e que está sempre vendido”, assegura Madalena Mota.
Madalena Mota é, em parceria com a irmã Sara, a gestora da Gorreana – Exploração Turística, que o pai, Hermano Mota, criou para elas, já que a Plantação de Chá Gorreana pertence à mãe, e diz à VIDA RURAL que “a nossa aposta é continuar a ‘Inovar com Tradição’, aumentando a produção para exportação em mercados que valorizam o nosso chá”. São já a quinta geração à frente da Gorreana, desde o seu início em 1883, e com funcionamento ininterrupto.
Madalena explica que “a Gorreana tem-se aconselhado com o Professor Batista, da Universidade dos Açores, um grande conhecedor de chá, para podermos salientar as suas características. Por exemplo, sabemos já que o chá verde tem mais antioxidantes e que também tem teanina, que tem propriedades calmantes”. José Batista tem vários trabalhos de investigação sobre as características de plantas e produtos açorianos, nomeadamente o chá verde.
A Alemanha é o maior cliente da Gorreana, em termos de peso na faturação, e é a pensar neste mercado que a empresa vai aumentar a produção em mais cinco hectares nos próximos três a quatro anos, que darão cerca de mais dez toneladas, “tudo para produzir Orange Pekoe Ponta Branca, que é a nossa ‘jóia da coroa’ e está garantidamente vendido, com maior mais-valia”, afirma a responsável. Nesta altura, a Gorreana tem 35 hectares de plantações, que produzem cerca de 40 toneladas de chá por ano, “somos uma ervilha no mundo do chá, por isso só podemos apostar na excelência e na diferença”.
Mas a empresa exporta apenas 11% da sua produção (para Alemanha, França, Brasil, China e Polónia, entre outros), ficando o restante nas ilhas – só a exploração turística da Gorreana (vendas na loja) arrebatam 40% da produção, tendo subido graças aos turistas do Continente, atraídos pelos voos low-cost – e no Continente, sendo a Jerónimo Martins um dos principais clientes já que “todas as semanas enviamos 300 caixas com 30 caixinhas de chá cada”.
Empresa socialmente responsável
Madalena Mota adianta-nos ainda um outro projeto da empresa que está já em desenvolvimento: uma parceria com a Santa Casa da Misericórdia da Maia, freguesia onde a Gorreana se situa, para a plantação de ervas aromáticas (já nesta campanha serão lançados o Chá Verde com Menta e o Chá Verde com Erva Luísa), um trabalho que ocupará pessoas desempregadas e com dificuldades, e cujas ervas serão utlizadas em novas misturas do Chá Canto. A marca que foi cedida à empresa pela família de José do Canto, proprietário e intelectual micaelense do século XIX, que promoveu a introdução de novas culturas e tecnologias agrícolas nos Açores, sendo também um apaixonado por flores, daí a plantação do Jardim José do Canto em Ponta Delgada.
Este projeto segue a tradição que já vem do avô, de ser uma empresa socialmente responsável, uma vez que o avô criou a primeira ‘creche’ da ilha, conta-nos Madalena Mota: “ele precisava da mão de obra das mulheres da freguesia, porque são muito mais minuciosas, por isso elas traziam os filhos que brincavam aqui no pátio e tinham também outras instalações próprias. E isso influenciou a vida e o desenvolvimento das mulheres da freguesia de uma forma diferente do resto da ilha porque eram mais independentes, já que ganhavam o seu dinheiro”. Ainda hoje as mulheres são as principais colaboradoras da empresa que tem 42 funcionários permanentes e ainda recorre a eventuais nas alturas de pico de trabalho.
Hidroelétrica salvou a empresa
O bisavô já tinha sido visionário ao aproveitar a água de uma das nascentes da propriedade para fazer uma central hidroelétrica que tornou a Gorreana autossuficiente em termos de energia, logo mais competitiva. Salvando-a de fechar portas quando todas as outras fábricas, que chegaram a ser seis na zona e muitas mais na ilha, tiveram de encerrar. A empresa foi a única plantação e fábrica de chá da Europa durante muito tempo, mas em 2001 reabriu ali perto a Chá Porto Formoso, no concelho da Ribeira Grande, com uma dimensão e produção bem mais pequena: cinco hectares de plantação e uma produção entre 12 e 14 toneladas de três variedades de chá preto por ano.
Regressando ao avô de Madalena, este foi também pioneiro no que diz respeito ao turismo: “as nossas plantações e a fábrica estiveram sempre abertas aos visitantes, mesmo para quem queria apenas vir tomar uma chávena de chá, gratuita, e apreciar a vista para a plantação”. Ainda hoje assim é, a porta está aberta das 8 h às 20 h e entra-se à vontade, serve-se um chá e pode-se passear pela fábrica que nos faz retornar à Revolução Industrial. A fábrica funciona de março a outubro com máquinas que são, quase todas, do início do século passado.
A Gorreana também tem novos projetos, porque a somar à Rota do Chá que já existe e percorre cerca de 6 km da plantação, com identificação dos tipos de chá que dali se retiram, “a Câmara Municipal está também a fazer connosco a Rota da Água, uma vez que temos nascentes na propriedade”.
Uma só planta, vários tipos de chá
O chá dos Açores é um híbrido de várias sementes que foram trazidas do Brasil, Índia e outros locais “e que se adaptou ao clima e solo da ilha”, diz a responsável, acrescentando que “aqui, como chove muito e continuadamente ao longo de todo o ano, também não precisamos de replantar o chá de cinco em cinco anos, como fazem nos outros países, a planta ‘renasce’ e dura cerca de 90 anos”.
Todo o chá deriva da planta Camellia sinensis que é uma pequena árvore da família das teáceas, as variedades conseguem-se por seleção das folhas e métodos de processamento.
“O nosso chá é totalmente isento de herbicidas, fungicidas, pesticidas e conservantes porque as pragas normais do chá não se desenvolvem no clima de São Miguel, pelo que temos um chá 100% biológico – cujo processo de certificação está a decorrer –, pois nas plantações usamos só fertilizante vegetal”, explica Madalena Mota, adiantando que nos países onde há a estação das chuvas há também mosquitos e a mosca-do-chá que pica ou morde o gomo terminal da planta e, como resultado, a folha acaba por não se desenvolver. Por outro lado, nos países da estação seca, há o aranhiço-vermelho.
“O chá verde resulta de uma seleção só do rebento, vai à máquina de vapor e travamos a oxidação, para não escurecer, depois é seco, enrolado (em movimentos circulares contrários como se estivesse entre duas mãos) e embalado. Já o chá preto fica em tabuleiros para oxidar, escurecendo, por isso tem mais acidez, e depois segue todo o processo igual de fabricação”, explica a responsável da Gorreana.
Artigo publicado na edição de abril de 2016 da VIDA RURAL