A mosca-da-azeitona é a principal praga da oliveira em Portugal. Esta praga, na generalidade dos anos, provoca perdas económicas importantes aos olivicultores, pelo que é da maior importância conhecer os seus estragos, quando ocorre e de que forma devemos lidar com ela. Aspetos como as relações que o inseto estabelece com a oliveira e o meio ambiente; a identificação e estabelecimento dos seus inimigos naturais; e a influência na gestão do habitat sobre as suas populações são algumas das linhas estudadas no Projeto financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia – EXCL/AGR-PRO/0591/2012 “Proteção da oliveira em modo de produção sustentável num cenário de alterações climáticas globais: ligação entre infraestruturais ecológicas e funções do ecossistema”.
A mosca-da-azeitona. O que é?
A mosca-da-azeitona, Bactrocera oleae (Rossi) (figura 1), é um díptero tefritídeo em que as fêmeas efetuam a postura dos ovos nas azeitonas; após alguns dias, a larva eclode e desenvolve-se no interior do fruto. A larva ao alimentar-se da polpa da azeitona vai construindo uma galeria estreita e sinuosa, que aumenta de tamanho à medida que a larva fica mais desenvolvida. No final do desenvolvimento larvar, o inseto pode pupar na azeitona, ou abandonar o fruto e pupar no solo, de onde sairá um adulto que iniciará uma nova geração. A duração de cada uma das fases de desenvolvimento do inseto depende de vários fatores, mas sobretudo das condições climáticas, no entanto em condições favoráveis o ciclo completo pode durar menos de um mês.
Que estragos/prejuízos ocasiona
A importância dos prejuízos causados por esta praga é variável de acordo com a região, o ano e o fim a que se destina a azeitona. Em algumas regiões do País, como o Alentejo, os níveis populacionais do inseto são muito elevados todos os anos enquanto em Trás-os-Montes, nalguns anos a sua importância é reduzida enquanto noutros, como por exemplo 2014, em alguns olivais os níveis de ataque da mosca atingiram praticamente a totalidade dos frutos. Se os frutos se destinarem à produção de azeitona de mesa, as picadas que a mosca origina para depositar os frutos são suficientes para lhes retirarem valor comercial. De uma forma geral 3-4% de frutos com picada são o máximo admissível, enquanto frutos com desenvolvimento de larvas são de todo inaceitáveis para a sua preparação em azeitona de mesa (figura 2).
No caso da produção se destinar à extração de azeite podem ocorrer prejuízos quantitativos e qualitativos. Os prejuízos quantitativos resultam em primeiro lugar do consumo de polpa por parte das larvas, e depois da queda prematura dos frutos atacados, enquanto os prejuízos qualitativos são resultado da perda de qualidade do azeite extraído de frutos atacados pela mosca.
O consumo de polpa da azeitona por parte da mosca é em geral desprezível, com exceção de cultivares com frutos pequenos onde esse consumo pode atingir 20% da polpa, o que é uma perda com grande significado. Contudo em cultivares de frutos médios ou grandes o seu consumo é baixo (3-5%). Durante a sua alimentação, a larva pode cortar alguns vasos condutores o que vai prejudicar a maturação do fruto e a fixação do fruto à árvore, provocando a sua queda, que para muitos autores é considerado o principal prejuízo causado pela mosca-da-azeitona.
Os prejuízos qualitativos dizem respeito à menor qualidade do azeite extraído de azeitonas atacadas, quer em termos de parâmetros físico-químicos quer ao nível organolético. Ao nível físico-químico é notório um aumento da acidez e índice de peróxido dos azeites extraídos, bem como uma redução da resistência à oxidação e diminuição do teor em antioxidantes naturais, aspetos com repercussões a nível sensorial. As galerias das larvas da mosca-da-azeitona são porta de entrada para o oxigénio e para a instalação de fungos e bactérias que vão provocar podridões, pelo que toda esta degradação ocorre em maior extensão quando as azeitonas são armazenadas antes da extração do azeite, prática de toda desaconselhada quando se pretendem extrair azeites de elevada qualidade.
Como fazer a estimativa do risco
Para a estimativa do risco da mosca-da-azeitona fazem-se observações semanais, a partir do início da lenhificação do caroço, e registo do número de capturas em armadilhas e da observação do ataque em frutos devendo seguir-se as recomendações oficiais de “Produção Integrada da Oliveira” (2010) publicado pela DGADR/DSPSV. Para a contagem do número de adultos em armadilhas, coloca-se uma armadilha McPhail, com uma solução de fosfato de amónio a 4% ao qual é adicionado 2,5 g de boro, no interior da copa da árvore, e uma armadilha adesiva amarela com feromona (figura 3), no exterior, distanciadas entre si cerca de 50 m, colocadas ao nível dos olhos do operador, na zona da árvore exposta a sul. Na observação visual do ataque em frutos colhem-se 10 frutos por árvore em cada uma de 20 árvores do olival.

Figura 3 – Armadilha cromotrópica amarela com feromona utilizada no acompanhamento dos adultos da mosca-da-azeitona
O nível económico de ataque (NEA) recomendado é diferente de acordo com o destino da produção, se para azeitona de mesa ou para azeite. Para azeitona de mesa, o NEA é atingido quando, em simultâneo é capturada uma fêmea, por dia e por armadilha de McPhail, e se observa 1% de azeitona picada com formas vivas e mais de 50% de fêmeas férteis. No caso da azeitona para azeite, para o primeiro tratamento, o NEA é atingido quando se observarem mais de cinco fêmeas por dia por armadilha de McPhail e mais de 60% de fêmeas férteis. Nos tratamentos seguintes considera-se a existência ou não de capturas em armadilhas de McPhail. Caso ocorram, o NEA é atingido quando se verificar a ocorrência, em simultâneo, de mais de uma fêmea por dia e por armadilha, mais de 60% de fêmeas férteis e 8 a 12% de frutos com formas vivas. No caso de não ocorrerem capturas em McPhail, o NEA atinge-se quando, em simultâneo, ocorrem três fêmeas adultas por dia em armadilhas adesivas e 8 a 12% de frutos com formas vivas.

Medidas de proteção em modos de produção sustentável
Em modos de produção sustentável a estratégia de proteção deve assentar em primeiro lugar num conhecimento profundo da cultura e das diversas interações que se estabelecem entre esta, os seus inimigos e o ambiente que os rodeia, só assim se podem estabelecer medidas de proteção eficazes contra a mosca-da-azeitona. Alguns destes aspetos têm sido estudados no âmbito do Projeto financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia – EXCL/AGR-PRO/0591/2012 “Proteção da oliveira em modo de produção sustentável num cenário de alterações climáticas globais: ligação entre infraestruturais ecológicas e funções do ecossistema”.
As medidas de proteção podemos dividi-las em medidas indiretas de proteção, que são aquelas que devem ser realizadas sempre mesmo que a cultura não esteja em risco, e nas medidas diretas de proteção, que se destinam a intervir diretamente contra um inimigo da cultura, neste caso a mosca-da-azeitona. De seguida referem-se alguns dos aspetos estudados recentemente na proteção da oliveira contra a mosca-da-azeitona, quer no que toca a medidas indiretas de proteção, como sejam a escolha de cultivares, a gestão do habitat para proteção e/ou fomento da ação da fauna auxiliar e a antecipação da colheita, quer sejam a aplicação de medidas diretas de proteção contra a praga.
É conhecida a diferente sensibilidade das cultivares de oliveira ao ataque da mosca-da-azeitona, contudo os mecanismos envolvidos nessa sensibilidade não se encontram verdadeiramente esclarecidos. Para o caso das cultivares mais difundidas na região de Trás-os-Montes, a Cobrançosa, a Madural e a Verdeal Transmontana, em igualdade de situações, a Cobrançosa tem-se revelado a menos atacada pela mosca-da-azeitona enquanto a Verdeal Transmontana mostrou ser a mais suscetível. Este facto estará relacionado com diferentes aspetos da planta, quer da própria árvore, da folha da oliveira e sobretudo do fruto. Neste último caso, nos aspetos físicos pode apontar-se a espessura da epiderme e da polpa, a forma, e o tamanho; nos químicos, a quantidade de gordura e sua composição, o teor em compostos fenólicos e a fração volátil; e também e alguns aspetos moleculares como estando envolvidos na diferente suscetibilidade da mosca-da-azeitona.
A colheita antecipada dos frutos tem sido outra das técnicas apontadas para minimizar os prejuízos provocados pela mosca-da-azeitona. Uma vez que o ataque dos frutos aumenta em grande medida durante os meses de outono, para além das vantagens que tem em termos de qualidade e composição química dos azeites extraídos, a antecipação da colheita para finais de outubro e novembro pode minorar os prejuízos provocados pela praga uma vez que parte das larvas ainda se encontram dentro do fruto, diminuir as populações iniciais para o ano seguinte, e a existência de orifícios de saída é menor, e a partir dessa época a queda de frutos atacados é mais intensa pelo que terá toda a vantagem e se proceder à colheita mais temporã.
A gestão do agroecossistema para fomentar a proteção biológica por conservação é uma das ferramentas mais importantes em termos de medidas indiretas de proteção e fomento da biodiversidade no olival. A fauna auxiliar indígena, principalmente em anos de ataques reduzidos ou moderados, pode ter um papel importante na manutenção das populações da mosca-da-azeitona a níveis considerados aceitáveis. É conhecida a ação de alguns grupos de insetos predadores, destacando-se a família dos carabídeos que se alimentam das larvas e pupas quando estas caem ao solo para pupar. Por outro lado, em algumas regiões, alguns parasitoides generalistas de dípteros têm também ação sobre estados larvares do inseto, a título de exemplo refere-se a espécie já identificada na região transmontana Pnigalio agraules, que atacam larvas de terceiro instar sendo a sua ação observada no início do verão em anos pouco quentes e com alguma humidade relativa. Aqui é de referir também o papel de algumas plantas espontâneas como reservatório de parasitoides da mosca-da-azeitona, como sejam por exemplo alguns cardos e a ínula, Dittrichia viscosa (figura 4). Assim, as flores desta última planta são atacadas pelo díptero tefritídeo Myopites stylata, que é hospedeiro alternativo de Eupelmus urozonus que, por sua vez, também ataca larvas da mosca-da-azeitona.
De entre as medidas diretas de proteção, nos últimos anos tem sido dado grande ênfase ao estudo de diferentes espécies de parasitoides larvares com realce para o braconídeo Psytallia concolor. No entanto os resultados não têm sido os esperados apontando-se sobretudo a falta de sincronismo entre o parasitoide e o hospedeiro, a falta de fontes alimentares e as condições climáticas para os fracos resultados alcançados. Contudo, alguns desses aspetos estão a ser estudados no sentido de fornecer fontes alimentares alternativas que possam melhorar o seu desempenho e ação em condições de olivicultura mediterrânea. A utilização do fungo entomopatogénico Beauveria bassiana, que foi identificado em larvas e pupas mortas na região transmontana tem dado também resultados promissores, havendo neste momento no mercado formulações tendo por base este fungo.
A aplicação de luta biotécnica contra a mosca-da-azeitona tem dado bons resultados em diferentes situações, quer através da captura em massa, utilizando dispositivos como as chamadas garrafas “Olipe” (figura 5), quer através da aplicação de luta atraticida, onde foram ensaiados diferentes dipositivos, dos quais o mais conhecido são as armadilhas Eco-trap.
As armadilhas “Olipe” devido ao baixo custo, facilidade de obtenção e facilidade de instalação têm visto a sua utilização aumentar nos últimos anos, contudo alguns aspetos como o tamanho dos orifícios, o número de orifícios e os atrativos a utilizar têm de ser ajustados.
A utilização da luta química faz também parte das opções a ponderar na proteção contra a mosca-da-azeitona, contudo é de ter em atenção que apenas são possíveis de utilizar os produtos homologados, nas doses recomendadas e na altura certa para que não ocorram problemas para o Homem e o ambiente e se obtenham produtos com a máxima qualidade, seguros e isentos de resíduos de pesticidas.
Artigo publicado na edição de março de 2015 da revista VIDA RURAL