José Gouveia, professor do Instituto Superior de Agronomia e um dos maiores especialistas e pedagogos nacionais em azeite, foi distinguido pela VIDA RURAL com o Prémio Personalidade Armando Sevinate Pinto. A cerimónia decorreu durante o congresso AgroIn, na passada quinta-feira (24 de abril) e coube a Teresa Sevinate Pinto, neta de Armando Sevinate Pinto, entregar o galardão.
Na ocasião, José Gouveia recordou o seu percurso profissional (especializou-se academicamente em vitivinicultura) e o panorama que encontrou quando começou a trabalhar em azeite. Na altura, anos ’80, “o único parâmetro de avaliação da qualidade do azeite nacional era a determinação do grau de acidez”, fator que condicionava a classificação de qualidade e fazia com que apenas 1,5 % do azeite nacional fosse considerado Virgem Extra. E lembrou, com humor, a forma caricata como se provava azeite: “Uma gota de azeite era colocada na zona da mão, denominada tabaqueira anatómica, em que se cheirava e provava o azeite. Naturalmente que a prova dependia principalmente do sabonete com que se havia lavado as mãos” …
Por ser um percurso louvável e de grande importância para o setor do azeite, partilhamos na íntegra o discurso de agradecimento proferido pelo professor José Gouveia na cerimónia de entrega dos Prémios VIDA RURAL, onde relata os momentos mais marcantes da sua vida profissional.
“Muito bom dia a todos!
Em primeiro lugar, gostaria de felicitar a Vida Rural, lembrando-me, naturalmente, do Eng.º Sousa Veloso e, muito principalmente, da família Sevinate Pinto por nos fazer trazer à memória esse bastião da agricultura portuguesa que foi Armando Sevinate Pinto, que recordo com saudade. Com ele, enquanto Ministro da Agricultura, tive ocasião de trocar impressões sobre as condições, na altura precárias, em que se encontrava o setor do azeite. Uma das minhas reivindicações era equiparar-se o setor do azeite ao setor do vinho: a obrigatoriedade de os lagares passarem a ter um técnico responsável e que a comercialização do azeite passasse a ser feita com o azeite embalado, com um rótulo que responsabilizasse o embalador e acabasse com a venda a granel. Com o tempo, tudo isso foi conseguido, felizmente.
Atribuírem-me o Prémio Personalidade Armando Sevinate Pinto faz-me sentir orgulhoso, mas, ao mesmo tempo, com o coração apertado por tamanha distinção, a sentir-me tão pequenino. Como me podem estar a equiparar a esse grande Mestre de nós todos, também ele homenageado com o Prémio Personalidade Armando Sevinate Pinto, o Professor Joaquim Quelhas dos Santos, que muito em breve vai estar connosco, a comemorar os 50 anos do meu-nosso curso de Agronomia e Silvicultura, na Tapada da Ajuda?
Não sei se serei digno de tão tamanha simpatia, o quererem fazer aqui e agora uma homenagem à minha pessoa. Isto fez-me fazer uma retrospetiva do meu passado e tentar perceber o porquê deste acontecimento.
Tudo começou depois de me ter licenciado em Engenharia Agronómica, em 1974-75. Já lá vão 50 anos (meio século ???) que vamos comemorar no dia 10 de maio próximo.
Estagiei em Torres Vedras, veja-se, em Vitivinicultura, tendo como orientador externo o Eng.º Jordão Martins, infelizmente também já desaparecido. Defendi o Relatório Final perante um júri que me saudou positivamente. A minha vida estava a correr bem, já como Assistente Eventual, no ISA. Depois, de repente, tudo mudou na minha vida!
Quando pensava fazer a minha carreira na área dos vinhos, como seria natural, o Professor Hélder Costa, responsável pela disciplina de Tecnologia Agrícola II, de óleos e gorduras, adoeceu e o Professor Manuel Vieira, então meu Chefe e de mais três Assistentes, decidiu que seria eu que iria ocupar o lugar dele. Grande machadada! Mas, na minha vida, felizmente, parece haver uma estrelinha que me acompanha e abracei a questão do azeite, um setor esquecido a nível nacional e mundial.

Havia, na altura, um boletim anual da Junta Nacional do Azeite que publicava os resultados das análises efetuadas ao azeite. Para fazerem ideia, o único parâmetro de avaliação da qualidade do azeite nacional era a determinação do grau de acidez e, somente com essa determinação, apenas 1,5 % do azeite nacional era considerado Virgem Extra.
A prova (análise sensorial ???) que se fazia era caricata. Uma gota de azeite colocada na zona da mão, denominada tabaqueira anatómica em que se cheirava e provava o azeite. Naturalmente que a prova dependia principalmente do sabonete com que se havia lavado as mãos.
Com a minha estrelinha a funcionar, o Conselho Oleícola Internacional (COI) resolveu, e bem, mudar aquele estado de coisas. Formou-se um grupo internacional, sob a batuta de Dom Rafael Quijano, grande expert em azeite com assessoria de Mme Bernardete Pajuelo, grupo esse formado por Francisca Gutiérrez, Hipólito Garcia Toledo e Juan Ramón de Espanha, Franca Camurati e Mario Solinas de Itália, Bem Romghane da Tunísia, Michel Choukroun da França, Bari Hersoy da Turquia, Marina Iaritridou da Grécia, e eu próprio e Paula Vasconcelos de Portugal.
Ao fim de três anos, com reuniões em vários locais destes países e trocas de azeites diversos, houve finalmente fumo branco e o método Internacional de Análise Sensorial de Azeites Virgens, foi aprovado em 1987, pelo COI, e, em 1991, pela Comissão Europeia.
Entretanto, também houve grande evolução nos métodos de análise química dos azeites que, constantemente, têm sido aperfeiçoados.
Da minha parte, e já doutorado, na companhia do meu grande amigo e companheiro de “route” Francisco Caldeira, estive também na génese das Regiões Demarcadas do Azeite, agora chamadas Denominações de Origem Protegida.
Prossegui no estudo de azeites monovarietais e levei a efeito, no Instituto Superior de Agronomia, muitos cursos de Análise Sensorial e um Curso de Mestrado, tendo por lá passado algumas centenas de formandos ligados ao setor, e não só.
Não quereria acabar, sem falar de uma grande amiga, importante no setor do azeite, a Catarina Balula, Secretária Executiva do COI.
E, naturalmente, daqueles que me são mais próximos, refiro-me à minha mulher Maria Cristina, mãe de 4 filhos e avó de 7 netos.
Peço desculpa por vos ter ocupado parte do vosso tempo e termino agradecendo, uma vez mais, esta distinção que alguém, com certeza, meu ou minha amiga se lembrou de fazer. BEM HAJAM todos”.