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Maus prenúncios para a reforma da PAC

Maus prenúncios para a reforma da PAC

Por Capoulas Santos. Deputado Europeu

No próximo dia 17 de Novembro, a Comissão Europeia apresentará o seu aguardado documento de orientação sobre a reforma da PAC. O Parlamento Europeu reagirá através de um Relatório em que procurará influenciar as propostas legislativas que, em função deste debate, a Comissão apresentará em Junho de 2011, desenvolvendo-se o processo negocial desde então até à aprovação final dos novos Regulamentos, pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu, na Primavera de 2012.

Os agricultores e demais agentes do mundo agrícola e rural terão assim o tempo mínimo necessário para saber com o que contam a partir de 2014 e poderão, até lá, começar a procurar adaptar-se e programar as suas actividades futuras e os seus investimentos.

A questão mais relevante será a questão orçamental.

A PAC é uma política cara e exige vultosos meios financeiros. Sem eles, num contexto de crescente globalização, não será possível garantir competitividade para a maioria dos sectores da agricultura europeia.

Na Europa, alargada a 27, e a que provavelmente se juntarão ainda a Croácia e a Islândia até 2014, desequilibrou-se muito o número dos contribuintes líquidos e dos beneficiários líquidos em termos financeiros. Para sermos práticos, há seis que pagam mais do que recebem e 21 na situação oposta. E os maiores contribuintes já deram sinais suficientes de que não querem aumentar a sua comparticipação para o orçamento comunitário, muito pelo contrário. Assim, a pressão e a cobiça sobre a ainda volumosa fatia agrícola do orçamento da UE (cerca de 40% do orçamento total da União) será maior do que nunca, pelo que uma solução mais justa e equitativa, com menos dinheiro e mais beneficiários, será uma equação seguramente muito difícil de resolver. Daí a necessidade de serem apresentadas justificações claramente entendíveis pela opinião pública para que os políticos que defendem um orçamento forte para a PAC, como é o meu caso, possam sentir respaldo.

Por outro lado, com um orçamento “comum” mais reduzido, será maior a tentação de alargar o co-financiamento nacional e de elevar a sua comparticipação, o que, para países com problemas de equilíbrio orçamental, como é o nosso caso, será fatal. Uma terceira alternativa, também nada favorável para Portugal, poderá ser o alargamento da margem de manobra dos Estados membros para atribuição de ajudas nacionais. Os maiores contribuintes preferirão certamente a hipótese de canalizar meios para os seus próprios agricultores do que para o orçamento comum. A prevalecer tal hipótese de renacionalização das políticas agrícolas, seria o fim da PAC e uma machadada de consequências imprevisíveis no ideal europeu.

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Neste contexto só fará sentido discutir o novo modelo da PAC se a discussão tiver por base a busca de uma clara definição dos melhores mecanismos de regulação de mercado, de um novo conjunto de critérios para distribuição das ajudas directas e uma listagem transparente de elegibilidades para os apoios ao desenvolvimento rural.

Depois, como sempre aconteceu no passado, deverão aplicar-se esses critérios, no caso das ajudas directas a cada um dos agricultores europeus e, no caso do desenvolvimento rural, a cada Estado-membro. Este somatório ditará automaticamente o montante do “envelope financeiro” que corresponderá a cada país.

Ora, contrariando toda esta lógica, os Ministros da Agricultura Francês e Alemão decidiram surpreender tudo e todos, no passado dia 14 de Setembro, divulgando um comunicado segundo o qual, para além de um conjunto enternecedor de considerações sobre o futuro da PAC, propõem, nada mais, nada menos do que antes de qualquer discussão, de qualquer definição do que quer que seja, se reparta já o futuro dinheirinho, de acordo com um só critério: cada um fica no futuro com a proporção do orçamento actual que já detém, independentemente do montante global para a PAC que vier a ser decidido.

Quer isto dizer que, se a aplicação objectiva dos novos critérios vier a determinar que um Estado-membro, por exemplo, Portugal, por aplicação de critérios comuns objectivos, terá direito a um apoio por hectare maior do que hoje tem (que é 5 vezes menos do que a média comunitária) e que a França, a Alemanha ou qualquer outro terá direito, pelos mesmos critérios, a um pouco menos, tal não será possível de aplicar porque, no primeiro caso, o novo quinhão não chegará para que cada agricultor receba aquilo a que tem direito.

A prevalecer esta tese absurda, que terá apoio certo dos actuais maiores ganhadores, que por acaso até sãos os maiores e mais influentes Estados-membros da União, para quê discutir a nova reforma?