O lançamento do novo Evel XXI foi o pretexto para a conversa com Pedro Silva Reis, presidente da Real Companhia Velha.
Como é que está o seu plano de replantação de cerca de 200 hectares de vinha até 2016?
O essencial desse plano foi cumprido, abrandámos um pouco o investimento a partir de 2009, por conta da crise, mas dessa área 80% da vinha foi reestruturada, ficou cerca de 20% por fazer, a aguardar melhores dias…
Nem prevê acabar até lá [2016]?
Provavelmente não… agora vamos consolidar. Quando delineámos esse plano tínhamos perspetivas de desenvolvimento do mercado português que não aconteceram, pelo contrário, o mercado encolheu cerca de 30% nos últimos 5 anos. Evoluímos bastante em termos de exportação, o que de certo modo compensou no volume de negócios, mas não compensou na rentabilidade. Lá fora temos um mundo a enfrentar em termos de concorrência, enquanto os consumidores portugueses se mantêm extremamente fiéis e leais.
É mais difícil criar valor na exportação? Em Portugal há um reconhecimento da marca Real Companhia Velha…
Sim, há um prestígio associado aos vinhos e uma valorização do consumidor português. E há também toda a cadeia, desde a produção à distribuição, enquanto lá fora temos de partilhar margem com a distribuição e a rentabilidade é inferior.
De qualquer forma o essencial [do plano de reestruturação] foi cumprido, as nossas incursões em novas castas, sejam elas estrangeiras, sejam castas muito antigas do Douro, foram feitas.
Nestes últimos anos a aposta foi mais na recuperação de castas tradicionais ou na experimentação de castas estrangeiras?
Na área dos tintos tínhamos como objetivo a expansão da mancha de Touriga Nacional, porque existia um défice de Touriga em relação às restantes castas. Hoje já temos um equilíbrio, há cerca de 10 anos devíamos ter cerca de 10% de Touriga Nacional, hoje estamos a chegar aos 40%, que é o objetivo.
Também recuperámos castas como o Rufete. Das várias castas antigas, chamadas exóticas, tentámos cerca de seis. Com a Rufete, resultou um vinho de certo modo surpreendente, diferente do que estávamos à espera, quase um tinto de verão, um tinto exótico, muito frutado e aromático, com uma textura muito diferente…
Começa a falar-se muito em Rufete…
Sim, inclusivamente os nossos vizinhos espanhóis, na zona de Salamanca, fala-se muito de Rufete. Como dizia, resultou um vinho cuja textura não é afetada por ser servido mais frio, pelo contrário, beneficia da temperatura de um branco. Gastronomicamente é muito interessante e tem sido uma grande surpresa.
Fizemos outro trabalho de pesquisa e desenvolvimento com a Tinta Francisca, uma casta muito falada, mas totalmente desconhecida. Os livros antigos falam muito, é reconhecida por alguns enólogos como sendo muito pouco oxidativa e com uma grande capacidade de envelhecimento, mas não se sabia muito mais do que isso… E ficámos absolutamente surpreendidos pela sua elegância, finesse e características enquanto jovem. Lançámos o ano passado uma Tinta Francisca monovarietal sob a marca Quinta das Carvalhas, que é a nossa marca de topo. Temos um talhão, que foi plantado há cerca de sete anos, com 2,5 hectares e agora estamos a reforçar essa área, porque é um vinho absolutamente extraordinário…
Como é que o mercado aceitou?
Por um lado é uma casta desconhecida, por outro é um vinho completamente diferente do que estamos habituados no Douro, onde falamos de musgo, de estrutura… E com este vinho estamos a falar de elegância, finesse e intensidade aromática e de sabores. É um divórcio completo, o que é muito interessante porque acabamos com a crítica de que os topos de gama estão a ficar monocórdicos, que são todos muito parecidos, que a receita é sempre a mesma. O consumidor que é muito focado na sua região ou na sua marca de vinho terá dificuldade em entendê-lo, mas quem tiver horizontes mais alargados, quem conhecer Borgonha ou Piemonte, descobre um vinho fantástico, com notas de cereja e de groselha que lembra o Pinot Noir. Tem uma acidez muito alta, mas tem o fator Douro, um corpo a envolvê-lo, não temos conseguido fazê-lo com menos de 14 graus. Mas como tem uma grande frescura não se nota o álcool. Ao fim destes anos, produzir um vinho novo a partir do Douro velho é muito importante.
Recuperam mais algumas castas ou foram essencialmente estas duas?
Abandonámos o Donzelinho Tinto, foi um bocado ‘fiasco’, o Bastardo também não resultou, ou seja, resultou no ensinamento, aprendemos à nossa custa… Nas brancas estamos bastante entusiasmados com uma casta que é o Samarrinho, que também está agora a dar que falar, mas quando foi preciso mostrar um vinho a Real Companhia Velha era a única que tinha a amostra… Ainda não estamos totalmente convencidos, está ainda em testes, vamos engarrafar um vinho, mas apenas para testes experimentais. Nós temos um rótulo que se chama Séries que usamos quando queremos ter um vinho engarrafado e olhar para ele e para a sua evolução. Fazemos uma distribuição muito limitada, e eventualmente pontual, para experimentar, e se vingar depois vira marca comercial. É um vinho muito atrativo, aromático, não tenho a certeza se dá um vinho completo em termos de padrão internacional, ainda não estamos 100% convencidos, mas o barulho que a casta está a gerar é importante do ponto de vista comercial.
Depois consolidámos o Alvarinho. Já tínhamos tomado a decisão estratégica de investir nessa casta e neste momento temos cerca de 20 hectares, esse projeto está consolidado e comercialmente está a andar bastante bem. Acertámos em dois aspetos, para além de produzirmos um Alvarinho de grande categoria, acertámos também por ser a única casta portuguesa completa, que consegue produzir um vinho com intensidade, de classe internacional, e tem essa nobreza de evoluir muito bem. E curiosamente cada vez que a tentamos misturar [com outras castas] ela não soma. O Alvarinho está na boca do mundo e é um cartão de visita. Foi uma aposta que saiu bem.
O projeto já está no ponto que queria do ponto de vista da viticultura e enologia? Vai continuar a investir nos vinhos do Douro e a desinvestir no vinho do Porto?
O ‘desinvestimento’ no vinho do Porto estagnou. Chegámos à dimensão que achamos adequada e que está associada à nossa produção própria. O vinho do Porto está quase nos 50% em valor e os vinhos do Douro nos 60% em volume. Comercialmente o vinho do Porto tem passado por um período difícil, ainda está em retração…
Continua a sentir retração, mesmo com os últimos números mais animadores?
Sim, pequena, mas continua. Contrariamente, o vinho do Douro está a crescer a dois dígitos. Também aí foi uma decisão acertada termos apostado nos vinhos do Douro.
Esta ‘revolução’ na empresa nos últimos anos foi pressionada por motivos financeiros, porque a atividade estava a estagnar, ou foi estratégia?
Foi a conjugação das duas coisas. Éramos uma equipa muito jovem e eu encarnava uma geração que queria mudar e experimentar novas coisas. Tinha um gap de idade em relação ao meu pai de 40 anos, são quase duas gerações. Nesse aspeto empurrei muito a empresa para a inovação e fomos buscar colaboradores de fora da região, o Luís Carvalho, por exemplo, que trouxe ideias novas e deu um grande contributo para essa nossa veia exploradora. Por outro lado, houve necessidade de nos recentrarmos com o mercado. Há 15 anos o Douro estava apagado e o Alentejo dava cartas. Foi necessário acontecer alguma coisa para que o Douro chegasse onde chegou. Por isso digo que foi a conjugação de duas coisas, sangue novo com necessidade de a empresa evoluir e não estagnar no tempo. Essa nossa apetência por inovar e experimentar também tem os seus ciclos. O grande resultado do que fizemos com esta experimentação foi que aprendemos muito. Continuamos a ser adeptos de rega, mas cada vez mais moderada, acreditamos que é fundamental na instalação, mas depois temos de ir ‘levantando o pé’ aos bocadinhos e apostar na gestão de parcelas. Há parcelas que devem ser regadas, outras que devem ser muito pouco e outras nada regadas. Esta dosagem teve de ser feita. Por exemplo, no último investimento que fizemos, que foi uma parcela de vinha de 2,5 hectares na Quinta das Carvalhas recuámos… fizemos uma vinha tradicional, de alta densidade, não regada…
Com que castas?
Touriga Nacional e Tinta Francisca.
Porque é que decidiram não regar, pelas características do terreno?
Pela morfologia do terreno, pelas características do local, pela sua exposição. Voltámos à grande densidade, a uma vinha não mecanizada, ou muito pouco, e sem rega. Vamos regar para plantar, mas depois vamos retirando. O nosso ensinamento é saber destrinçar o que podemos fazer em cada parcela e não ter uma bitola única, porque a nossa gama também não tem uma bitola única. Temos o vinho mais vendido do Douro, na gama dos 2,99€ no consumidor e um topo de gama de 30€. São dois mundos totalmente diferentes, um é feito em inox, outro feito em lagar. Pelo meio temos vinhos cheios de especialidades, o nosso portefólio tem 30 vinhos, o que é um absurdo sob o ponto de vista racional, não faz sentido ter tantas referências…
São 30 vinhos mas um número limitado de marcas… há muita tentação de criar inúmeras marcas…
Mantemo-nos fiéis às 6 marcas, 3 clássicas e 3 novas. As clássicas são Porca de Murça, Evel e Granjó, duas centenárias e uma que para lá caminha. Depois as marcas de última geração, Aciprestes, Cidrô e Carvalhas. Mas são 30 vinhos absolutamente diferentes, a nível de castas, de estilos, só o Cidrô tem 30 varietais…
Não é caótico gerir comercialmente 30 vinhos diferentes?
É… é um conflito entre a racionalidade e o prazer de apresentar coisas diferentes. Onde é que o nosso trabalho é facilitado? É que como são totalmente diferentes, sem paralelo no mercado, suscitam curiosidade no mercado e tornam-se mais fáceis de comercializar.
É um esforço enorme ter de explicar essas diferenças aos consumidores, aos distribuidores e por aí fora…

Essa é a lógica. Vivemos períodos conturbados nos últimos cinco anos, em que o mercado esteve avesso a novidades e a extensões de linha, chegávamos a um restaurante e as pessoas nem queriam ouvir falar em coisas novas… Mas de repente o mercado começou a perguntar por novidades. E o turismo tem tido um papel predominante no sentido de animar a nossa economia. O mercado está hoje ávido de novidades e muito recetivo, e curiosamente habituaram-se a perguntar por novidades, tornámo-nos numa empresa conhecida por isso mesmo e já estranham quando não temos. Vamos apresentando algumas coisas, na gama Cidrô por exemplo, um dos vinhos que mais tem surpreendido o mercado tem sido o Cidrô Gewurztraminer, que é absolutamente extraordinário. Todas estas castas tem uma história e um porquê. Às vezes perguntam-me como é que nos lembramos de ir plantar Gewurztraminer, que não tem nada a ver com o Douro e com Portugal. É simples, quando andámos à procura de castas aromáticas, porque somos produtores de Moscatel no planalto de Alijó e por isso estudamos os vários tipos de moscatéis nos mais diversos formatos, inevitavelmente tropeçámos nas outras castas parecidas com o Moscatel, e aí encontrámos o Gewurztraminer. Alguns dos nossos vinhos tinham uma certa dependência de Moscatel em termos aromáticos e fomos à procura de outras alternativas que trouxessem uma carga aromática com mais finesse…
Nunca sentiu que estas castas estrangeiras pudessem retirar alguma identidade aos vossos vinhos que se assumem como vinhos do Douro?
Achamos que não, até porque temos essa questão bem arrumadinha. Enquanto há quintas das nossas propriedades onde imperam a tradição, as castas locais, as vinhas velhas, as castas antigas, como a Quinta de Carvalhas e Aciprestes, o Cidrô é a nossa propriedade cosmopolita e onde concentramos todo esse banco de ensaios, e é daí que saem todas essas castas estrangeiras. Está associada a um segmento da Real Companhia Velha e não interfere no estatuto tradicional da empresa.
Continuam a fazer distribuição própria?
Continuamos com a nossa distribuição própria no mercado nacional e em alguns mercados estrangeiros trabalhamos com parceiros locais. Tem corrido bem, temos um bom rácio de performance, não temos uma equipa de vendas tão grande como gostaríamos, não chegamos a todos os pontos de venda, mas temos uma equipa reacional que nos permite chegar até onde há rentabilidade. Às vezes há determinadas coberturas de território que não se justificam, encarece muito. Estamos com uma distribuição equilibrada.
Privilegiam alguns segmentos em detrimento de outros? Mais canal Horeca, por exemplo?
Todos os canais são importantes, uns pelo volume, outros pela imagem, outros pela componente variedade, tratamos todos com o mesmo grau de importância mas estamos a segmentar a gama de vinhos orientados para gastronomia e para restaurantes, outros que são nichos.
A empresa sofreu uma enorme reestruturação nos últimos anos, encolheu muito. Esse trabalho está terminado? A empresa está à sua medida?
Está à medida no formato. Mas nos custos, já se sabe, cortamos de um lado e aparecem do outro. Hoje somos 45 pessoas na sede e 39 nas quintas, mais os eventuais.
Pensam vender mais alguns ativos? Venderam recentemente os armazéns em Vila Nova de Gaia…
Não, está estabilizado, não pensamos vender mais nada.
Apostaram recentemente no relançamento do espumante. O mercado estava a pedir ou foi teimosia sua?
Na realidade não tive grande mérito nisso e até fiz algum contravapor inicialmente…
Porquê?
Os espumantes para nós eram uma história que durou um século. Entre 1900 e 2000 produzimos espumante de uma forma massiva, fruto do negócio da época. Chegámos à conclusão que não era um produto diferenciado, não dava margem e não tinha vantagem concorrencial em relação ao que estava no mercado. Por razões estratégicas resolvemos terminar com essa produção, as instalações onde o fazíamos exigiam grandes remodelações para estarem de acordo com as normas, não justificava o investimento e parámos. Recentemente, por causa da nossa produção de Chardonnay e Pinot Noir, o nosso enólogo Jorge Moreira começou a desinquietar-me para experimentar produzir um espumante… Como está a surgir um nicho muito interessante de topos de gama, e tendo nós a matéria-prima à mão de semear, avançámos com a experiência e ficámos extremamente surpreendidos com o resultado, fizemos um espumante de grande categoria. Se temos a matéria-prima e as condições, porque não? O problema do passado era o vinho-base, que não tinha as características adequadas para ‘espumantizar’… quando a matéria-prima é boa o resto é mais fácil. Depois havia a dúvida se o podíamos comercializar como tal. E o teste que fizemos está a resultar muito bem e estou muito orgulhoso deste produto. Claro que num formato muito diferente, chegámos a fazer 600 ou 700 000 garrafas, tínhamos um stock de quase 3 milhões de garrafas e agora a ambição é fazer 30 000.
E o Evel XXI, porquê este lançamento, esta segmentação?
Resulta da necessidade comercial de o Evel dar mais um passo, é uma marca que está a comemorar 101 anos, tem um padrão qualitativo bem definido, está associado a um determinado segmento de mercado. Temos feito um esforço qualitativo muito grande para descolar desse segmento mas chegámos à conclusão que é a esse segmento que pertence e não dá mais, precisa é de umas atualizações para lhe mudar o perfil. E porque é um padrão criado no século passado, pensámos que fazia sentido criar um novo padrão, muito associado à restauração, num segmento qualitativo superior, numa faixa de preço que simbolizasse a vitalidade da marca, a sua capacidade de renovação, de rejuvenescimento, no sentido de criar um padrão ligado ao século XXI. Isso resultou, e quem o batizou acabou por ser o mercado. Foi lançado o ano passado por ocasião das comemorações do centenário da marca. Chamámos-lhe Evel Centenário e no rótulo, por graça gráfica, colocámos XXI para assinalar. Mas no mercado ninguém o tratava por ‘Centenário’ mas sim por XXI. E assim ficou. O padrão de vinho foi um sucesso e temos possibilidade de o repetir. Nos brancos não tínhamos nenhum Douro clássico sem ser monovarietal, e pensámos: lançar uma marca nova para quê, se temos este espaço? Então este ano lançámos o branco para ver se o mercado é capaz de reconhecer a diferença entre o Evel corrente, o Evel colheita e o Evel XXI.
O foco é mercado nacional?
Sim, se resultar ponderamos exportar.
Sente uma dinâmica diferente no canal Horeca no Porto, com o aumento do turismo?
Sim, até porque grande parte das vendas de vinho do Douro são feitas a norte. O Porto é mercado importante e a restauração do Porto abraçou os vinhos do Douro.
Quanto aos vinhos do Porto, onde tem havido algum desinvestimento, prevê mexidas nessa área, com novos formatos ou conceitos?
Temos alguns ajustamentos, estamos agora a lançar um ‘lágrima’ branco premium.
Houve uma revolução nos Porto nos últimos anos com os pink, o regresso dos brancos, a utilização como base para cocktails…
Aderimos a tudo isso, nalguns fomos pioneiros, noutros acompanhámos a onda, mas francamente nada disso mudou a nossa vida. Vai funcionando, vai dando umas lufadas de ar fresco ao vinho do Porto, mas não tem ganho uma dimensão que mude a vida das empresas. O lado tradicional do vinho do Porto ainda é o que continua a sustentar as empresas, e nessa área o que conta é a perceção qualitativa e o grande esforço no segmento dos vintages. Cada vez produzimos menos quantidade, com mais qualidade, nos LBV, nos Porto datados, há muito cuidado nesses segmentos. Depois é a gestão de parcela, do lagar, da vasilha, é um pouco a nossa vida. O nosso negócio estabilizou, só fazemos a nossa marca, não fazemos marcas de terceiros e esse é um segmento muito grande do negócio. Mas temos feito bons progressos, salvaguardamos a nossa marca. Fizemos uma aquisição em 2008, com a compra da Delaforce, que temos estado a reforçar no seu grande mercado que é a Alemanha, com grande sucesso, e estamos também a relançar a marca nos Estados Unidos e Inglaterra.
Há pouco falou que a crise interna obrigou a reforçar a presença nos mercados internacionais. Houve conquistas de mercados novos? Qual é a aposta nos mercados externos?
Não temos mercados novos. Mercados que já tiveram tradição ou que já se estavam a desenvolver, isso sim. Angola tornou-se um mercado muito importante para nós, o Porca de Murça tem-se desenvolvido bem, o Brasil para nós é um mercado com mais de 200 anos, nos Estados Unidos também está a correr bem e temos alguns desenvolvimentos interessantes em alguns países europeus, que são mercados novos para alguns segmentos do nosso portefólio, mas que são mercados de sempre para o vinho do Porto, estamos é a estender a gama. Em mercados onde vendíamos vinhos mais económicos estamos a conseguir vender a gama média e gama alta.
Neste espírito de inovação e modernização do negócio, como é que olha, como gestor, para as ‘velhinhas’ regras do Porto, como a ‘lei do terço’ ou o ‘benefício’. Continuam a fazer sentido, ainda são essenciais para manter a regulação do mercado do vinho do Porto?
Acho que ainda têm algum mérito. Também tenho momentos de ser mais contra ou mais a favor, à medida que os tempos evoluem e a economia anda para cima e para baixo. Os conflitos da liberalização, ou não, ensinam-nos que alguma prudência é vantajosa. Aquilo que tenho defendido é uma evolução dessas regras, flexibilizando alguns padrões. Acabar com a ‘lei do terço’ de repente seria altamente perturbador para o setor, mas uma desregulação progressiva, tática, cirúrgica, poderá ser altamente benéfica. Não faz sentido que o vintage tenha de fazer lei do terço. Um produtor que faça garrafinhas de vintage, porque é que tem de constituir um stock para as vender? Está a inibir alguns produtores de se emanciparem, de terem uma vida própria. Como o Porto branco, que se quer jovem, fresco, porque é que há de ter stock? Se se começasse a implementar uma desregulamentação, primeiro numa categoria sem impacto, isso poderia ter repercussões positivas na região, sobretudo para os pequenos e médios produtores. Se começássemos a dar vida própria ao Porto branco, descolá-lo do tinto, talvez isso fosse bom para se criar na própria região o hábito de consumo de Porto branco, que é uma coisa que não existe, porque sempre foi um produto de exportação. Seria um risco calculado e com fraco impacto, mas que poderia ser benéfico para as gerações vindouras, para se começar a criar um consumo local com base nisso.
O setor tem pressionado, de alguma forma, o poder legislativo com estas ideias?
O setor é muito conservador…
E pouco unido…
Conservadores e desunidos nunca conseguem consenso para nada…
Artigo publicado na edição de junho de 2014 da revista VIDA RURAL