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Pecuária

Resposta pode estar na vacinação precoce e redução de stress

Ministro do Ambiente defende redução da produção de bovinos entre 25 a 50%

A Doença Respiratória Bovina (DRB), também referida como Síndrome ou Complexo, é a doença mais comum em bovinos em todo o mundo, principalmente em sistemas intensivos de produção de leite e carne. A chave para a sua prevenção é reduzir os fatores de stress e vacinar precocemente os animais contra os vírus e bactérias que mais frequentemente provocam a doença.

Não há dados sistemáticos sobre a doença, mas o site da Zoetis Portugal dá conta que “em toda a Europa estima-se que a DRB leva a perdas económicas que ascendem aos 576 milhões para a indústria da produção de bovinos. 58% dos custos resultam da diminuição do peso corporal, mortalidade e custos adicionais de maneio e tratamentos aos animais. Perdas estimadas, por animal, devido à DRB: 65€ por vitelo, em raças leiteiras e 123€ por vitelo de carne”, citando Andrews A.H. (2000) Cattle Practice Vol 8 Part 2: 109-114.

Nestes cerca de 15 anos muita coisa melhorou em termos de conhecimento da doença e disponibilidade de meios de prevenção, nomeadamente vacinas para os principais agentes que a provocam. Ainda assim, continua a ser uma preocupação nas explorações, principalmente com animais estabulados. “É uma condição patológica multifatorial, que pode ter várias causas possíveis e, normalmente, só se manifesta quando mais de uma causa está presente”, explica Pedro Meireles.

O médico-veterinário da SVA – Serviços Veterinários Associados – adianta que “a síndrome está muito associada a situações de stresse e quando o bem-estar animal é colocado em causa, devido às técnicas de maneio, vacinações, transporte e no período pós-parto, que é tipicamente uma altura de maior stress e em que há transmissão de imunidade da mãe para o vitelo, através do colostro”. Daí a importância da sua ingestão em quantidades suficientes nas primeiras horas de vida.

“A síndrome está muito associada a situações de stress e quando o bem-estar animal é colocado em causa, devido às técnicas de maneio, vacinações, transporte e no período pós-parto.”

A doença é endémica, mas “espera-se que seja de baixa incidência se assegurarmos o bem-estar e a ausência de stress”, diz. Mas Pedro Meireles salienta que a ação principal para prevenir a DRB é “fazer uma vacinação intensiva nos primeiros meses de vida. Nas explorações com que trabalho faço a primeira vacina logo no início de vida, seguida do reforço e depois nova vacinação seis meses depois”. Assim, em conjunto com boas práticas, a probabilidade de DRB em adultos fica minimizada”. Mas há muitos médicos-veterinários e produtores que praticam a vacinação anual ou até semestral de todo o efetivo, “todavia tal só deverá ser feito em situações onde está comprovada a necessidade, tal como em situações onde as explorações são abertas, isto é, têm entradas frequentes de animais mais novos na exploração ou o risco de doença é elevado”.

Elevada morbilidade, mas baixa mortalidade

Vítor Santos, da Promilker, empresa de produção de leite em Avanca, Estarreja, com cerca de 500 vacas em ordenha num total de 1200 cabeças de gado, conta-nos que “já temos tido surtos da doença, principalmente na fase pós-desmame, porque há sempre algum stress. Foi onde a DRB nos casou mais problemas, aumentando a mortalidade dos vitelos até aos seis meses, mas agora estamos a vacinar os vitelos logo quando nascem (primeira vacina e reforço) e depois de novo até aos seis meses e já não temos tido problemas. Daqui a dois ou três anos todo o efetivo estará protegido”. O produtor indica que “nos animais adultos, o síndrome manifesta-se principalmente por perda de fertilidade, mas não temos tido muitos casos”. O médico-veterinário Pedro Meireles, que trabalha com esta exploração, sublinha que os casos de mortalidade ocorreram em animais de um só lote e teve a ver com o historial desses animais. Normalmente, “o Complexo Respiratório Bovino está muito relacionado com a saúde global do animal, sendo uma doença de elevada morbilidade, mas baixa mortalidade”.

O criador da Promilker afirma que “a prevenção é sempre o método mais eficaz e mais barato e é aí que estamos a apostar, em conjunto com um maneio calmo, com o menos stress possível para que os animais não fiquem em condição debilitada e a doença se manifeste, aumentando também os níveis de conforto, o tipo de camas, o controlo da temperatura e a ventilação, para uma boa qualidade do ar e baixar a temperatura do estábulo”.

vacas leiteiras - pasto

Maneio calmo

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João Diogo Ferreira, da AgriAngus – empresa de criação de bovinos da raça Aberdeen-Angus (com 60 animais na exploração principal em Santa Cita, Tomar, e 50 puros noutro local) – vende animais cruzados de carne e puros para reprodutores e considera que “a docilidade característica desta raça ajuda muito a prevenir o stress e logo a não causar baixas imunitárias, que são uma das principais causas da doença se instalar”.

A raça Angus é a mais populosa em todo o mundo precisamente por ser dócil e mocha (sem cornos), “com um excelente temperamento que possibilita um fácil maneio, bem como uma grande facilidade de partos, sendo inclusive utilizada para cruzamentos com bovinos de leite; e de precocidade sexual, com a primeira cobrição a ocorrer cerca dos 14/15 meses”, revela João Ferreira, que está a terminar o curso de médico-veterinário.

Além de também praticar a vacinação logo nos primeiros meses de vida “para os principais agentes patogénicos do trato respiratório”, o criador – cuja empresa é resultante de um projeto de jovem agricultor e pertence ao grupo CaçaBrava, lançado há mais de 20 anos pelo pai, Fernando Jorge Ferreira – defende que “é fundamental não stressar os animais, por isso temos muito cuidado com o maneio, não gritando com os animais, e temos muita atenção principalmente no desmame, que é uma das fases mais stressantes. Fazemos um desmame humano, já que os vitelos ficam separados das mães apenas por uma vedação, veem-nas e aprendem com elas”. O futuro médico-veterinário salienta ainda que “os nossos animais estão em campo, mas têm instalações para alimentação e mesmo quando têm de ser tratados todo o pessoal teve formação para lidar com eles sempre com calma”.

“A prevenção é sempre o método mais eficaz e mais barato e é aí que estamos a apostar, em conjunto com um maneio calmo, com o menos stress possível.”

João Ferreira refere que a incidência da exploração em DRB é inferior a 2%. “Tivemos apenas alguns problemas quando foram importados no verão, pois vieram da Dinamarca e Irlanda. Embora a raça se adapte bem às nossas características edafoclimáticas, desde que tenham sombra e boa alimentação”.

Bem-estar é fundamental

“Tudo está muito relacionado com as condições de bem-estar animal”, defende Pedro Meireles. O médico veterinário da SVA informa que, em Portugal, a doença existe em todo o território, mas o Alentejo é a região com maior predisposição para a síndrome devido ao clima muito rigoroso, principalmente ao calor. “Os animais autóctones, como a Raça Alentejana, estão mais preparados, mas os exóticos são mais suscetíveis. A Raça ­Holstein/Frísia – maioritária na produção de leite, está preparada para temperaturas máximas até 14 °C, por isso tem mais problemas e a época de maior incidência é no verão e quando ocorrem eventos stressantes”.

Como já referimos, a doença é multifatorial e tem uma componente vírica e outra bacteriana, pelo que não há tratamento, mas há antibióticos que podem ser administrados para controlar a DRB. O problema, frisa Pedro Meireles, “é que para assegurarem que tudo é bem feito, os médicos-veterinários optam normalmente por tratamentos curtos, entre três a cinco dias, mas o ideal seria o tratamento prolongar-se por 30 dias. Por isso é que os prognósticos dos animais adultos com DRB são sempre reservados, porque a recidiva é provável. Para conseguirem prolongar os tratamentos, os médicos-veterinários tentam fazer coincidir o tratamento com o período de secagem, embora nesses casos com um tratamento tão prolongado também não se consiga eliminar o fator de stress que é ter de o manusear e colocar num tronco diariamente”.

Artigo em colaboração com a revista VETERINÁRIA ATUAL e publicado na edição de junho de 2014 da revista VIDA RURAL