Uma exploração agropecuária moderna, em extensivo ou intensivo, tem de faturar todo o ano e, para isso, tem de produzir todo o ano. A principal mudança ocorrida nos últimos anos em termos de maneio reprodutivo passou pela opção por manter os touros de cobrição durante todo o ano com a vacada ou de fazer inseminação artificial. Pedro Espadinha, secretário técnico da Associação dos Criadores de Bovinos da Raça Alentejana (ACBRA), dá o exemplo desta raça: “a principal alteração do maneio reprodutivo das vacadas da raça Alentejana está relacionada com a mudança da época de partos, em alguns criadores, por se optar por manter o touro durante todo o ano na vacada”. Também Fátima Veríssimo, secretária Técnica da Associação de Criadores de Limousine (ACL) afirma que “verificaram-se algumas alterações relativamente às épocas de cobrição e consequentemente épocas de parto. Aumentou o número de criadores a escolher o melhor emparelhamento, ou seja, escolher determinado touro para beneficiar/cobrir um grupo específico de fêmeas tendo em vista o melhoramento genético de reprodutores (escolha das melhores linhas genéticas para determinado fim produtivo; no geral produção)”.
Por seu lado, o presidente da Associação Portuguesa de Criadores de Bovinos de Raça Charolesa (APCBRC) salienta que “os criadores de efetivos de raça pura são pessoas com um controlo e atuação mais cuidada do que quem detenha apenas um efetivo cruzado, por isso há um maneio mais apurado”. E José Luís Lopes explica que “os cruzamentos são orientados, utilizam-se determinados touros para determinadas vacas ou usa-se inseminação artificial”. O responsável da associação de criadores de Charolês adianta que estas mudanças devem-se principalmente “à introdução de novas técnicas relacionadas com o aumento da eficiência da produção, permitindo melhores índices produtivos”, dando o exemplo da utilização da inseminação artificial “que permite o uso da genética que, de outra forma, não seria possível”. José Luís Lopes frisa ainda que, “nos últimos anos tem havido uma vulgarização do controlo ecográfico, do uso do ecógrafo, devido à existência de aparelhos portáteis”.
Já Pedro Espadinha salienta “o início da comercialização da carne de novilhos inscritos no Livro Genealógico como produtos com Denominação de Origem Protegida (DOP) e a necessidade de garantir a sua comercialização ao longo de todo o ano”. O secretário técnico da ACBRA lembra que a produção de bovinos da raça Alentejana esteve associada, durante muitos anos, à produção de cereais de inverno, sendo normal fazer-se coincidir a época de partos após a entrada da vacada nos restolhos. “A diminuição generalizada da produção de cereais de inverno e a instalação de pastagens semeadas ou melhoradas permitiu que os criadores optassem por diferentes tipos de maneio”.
Fátima Veríssimo considera, por seu lado, que “esta evolução deve-se sobretudo a um maior esclarecimento dos criadores, e também ao aumento da exigência de certificação pela ACL, levando à melhoria das técnicas de produção dos criadores selecionadores”. Além disso, acrescenta: “deve-se também devido ao próprio mercado (compradores de reprodutores) que vão conhecendo cada vez melhor a raça Limousine, fruto da forte promoção realizada pela ACL, e que estão cada vez mais informados e exigem cada vez melhores animais”.
Novas técnicas e tecnologias
As ‘culpadas’ pela introdução de novas técnicas e tecnologias são, em grande medida, as empresas que oferecem soluções de saúde animal. André Pires Preto, technical services da Ruminant Business Unit da MSD Animal Health explica que a abordagem da empresa “é bastante clara na área de reprodução de bovinos de carne, porque não nos vemos apenas como ‘fornecedores’ de produtos, mas sim de soluções, para que médicos veterinários atuem no campo e obtenham melhores performances (re)produtivas. Segundo a nossa visão, essas soluções reprodutivas são bastante abrangentes, no sentido de que a ação médica veterinária seja a mais integrada possível. Como?” Através de duas áreas fundamentais, adianta André Preto: a saúde da vacada (atuando a montante na reprodução, profilaxia reprodutiva de agentes causadores de infertilidade) e através do PlanParto, sendo parceiros na reprodução animal.
Também Francisco Castanheira, technical sales manager da Alltech, salienta que a empresa “dispõe do‘Beef Advantage Program’ que consiste num conjunto de soluções naturais, adequadas para resolver os desafios que têm impacto na produção e rentabilidade das engordas modernas. Este programa engloba todos os esforços da Alltech para assegurar a satisfação do cliente, desde a qualidade dos nossos produtos, os workshops e programas educacionais para técnicos e produtores, a tecnologia e equipa de investigação disponível, as ligações com consultores mundiais da especialidade. O objetivo é oferecer aos nossos clientes a possibilidade de partirem em vantagem neste mercado competitivo”.
O responsável da Alltech adianta que “a nossa abordagem passa por olhar para todo o processo produtivo, desde a fase do vitelo, à fase de acabamento como também ao nível dos processadores da carne. Todas as nossas soluções aumentam a produtividade, melhoram os níveis de saúde do animal e assegurando uma produção mais eficiente”.
Igualmente a Vetlima possui vários produtos e material para a área da reprodução bovina, afirma o presidente do Conselho de Administração da empresa, que atuam no bovino fêmea tentando controlar o desenvolvimento de quistos ováricos, indução da ovulação para inseminação a tempo certo, e outras ações do foro reprodutivo que se conseguem com a estimulação da hipófise a nível do equilíbrio hormonal que deve decorrer em todas as fases do ciclo”, diz José Carlos Duarte.
O mesmo se passa com a Zoetis, onde Rita Afonso, product manager & mpower coordinator explica que na área da reprodução de bovinos de carne, a empresa dispõe de hormonas e antibióticos injetáveis.
“A sincronização de animais de carne tem essencialmente três objetivos: viabilizar o recurso à inseminação artificial em extensivo, concentrar partos ou, no caso de estar a ser utilizada a tecnologia de transferência de embriões, sincronizar fêmeas dadoras e recetoras. A concentração de partos em explorações de bovinos de carne permite otimizar a disponibilidade de alimento e obter lotes de vitelos mais homogéneos”, afirma Rita Afonso.
Apoio aos médicos veterinários
A Vétoquinol e a Merial não têm materiais específicos para a reprodução, mas destacam produtos (como suplementos) que têm impacto na reprodução. Pedro Reis, diretor ibérico de marketing da Vétoquinol fala de “suplementos à base de Selénio e Vitamina E e cálcio, ambos indicados como complementos ao tratamento de estados de esterilidade/diminuição da fertilidade”. Enquanto José Miguel Lopes Jorge, diretor de marketing e serviços técnicos da Merial, refere uma vacina “contra o IBR, doença que tem impacto reprodutivo (abortos entre os 4 e os 7 meses de gestação) e desparasitantes, que limitam o impacto negativo dos parasitas têm na ingestão de matéria seca (balanço energético negativo), com consequente influência na atividade ovárica.
As empresas que têm produtos específicos para a reprodução bovina trabalham em conjunto com os veterinários e têm programas de apoio, acompanhamento e formação, como referiu Francisco Castanheira da Alltech. Mas também André Preto salienta que “nos últimos sete anos, a disponibilização de serviços ao veterinário tem sido uma aposta constante da MSD Animal Health, embora nem sempre com o mesmo nome, servindo objetivo de fornecer as tais soluções integradas, que vão favorecer diretamente o produtor agropecuário, garantindo assim a sustentabilidade da fileira produtiva”.
O responsável frisa ainda que “no âmbito da reprodução de vacadas de carne, fomos pioneiros na introdução de programas reprodutivos (PlanParto) que em conjunto com alguns veterinários e os seus produtores têm tido um progresso extraordinário”.
Rita Afonso adianta, por seu lado, que “o apoio técnico prestado pela Zoetis aos veterinários e produtores vai no sentido de ajudá-los a otimizar a eficiência produtiva das explorações através da melhoria da eficiência reprodutiva”. Assim, “a Zoetis disponibiliza um serviço de consultoria independente que os apoia na seleção de explorações de bovinos de carne, identificando pontos críticos de maneio e implementado protocolos que vão melhorar os indicadores reprodutivos na vacada. Os planos de ação são desenhados de forma costumizada e adaptados à realidade da exploração”.
De igual forma, o presidente do CA da Vetlima, José Carlos Duarte, diz-nos que “a classe veterinária que trabalha em reprodução tem o nosso apoio técnico no acompanhamento à utilização destes produtos. A Vetlima tem ainda todo o material atinente à inseminação artificial quer bovina, quer de todas as outras espécies, bem como todo o material para colher e transferir embriões, dando apoio técnico prático em ambas as áreas onde temos pessoal especializado, preparado para atuações no terreno”.

Mais e melhores animais
Os responsáveis das três associações de criadores com quem falámos não hesitam em garantir que nos últimos anos as explorações suas associadas produzem mais e melhores animais. Fátima Veríssimo, da ACL, afirma que “a raça tem vindo a crescer de forma consistente e sustentada. E é cada vez mais reconhecida no mercado nacional não só em linha pura, como nos cruzamentos com as raças nacionais/autóctones. Muito em parte ao esforço da ACL em promovê-la e informar cada vez mais e melhor sobre todas as suas características, devidamente reconhecidas por todos: facilidade de partos, rapidez de crescimento, docilidade e rusticidade, e qualidade da carne. Os principais destinos dependem dos objetivos: produção de reprodutores – mercado nacional e mercado espanhol para a produção em linha pura e mercado nacional: para cruzamento com as vacadas cruzadas e com as vacadas das raças nacionais; produção de carne – mercado nacional”.
Enquanto José Luís Lopes diz que “a raça Charolesa tem vindo a crescer, com o efetivo a registar algum aumento. As explorações têm tendência a crescer para aumentar a rentabilidade”, justifica. Por seu lado, Pedro Espadinha revela que “a raça Alentejana é, em termos numéricos, uma das principais raças bovinas autóctones, com 16 073 fêmeas reprodutoras ativas inscritas no Livro Genealógico, 9177 das quais exploradas em linha pura, distribuídas por 174 criadores” e conta que a raça está em franco crescimento, até além-fronteiras: “a nível internacional, a procura por animais da raça Alentejana é enorme. Brasil, Angola, Moçambique, entre outros, são alvos da internacionalização da raça”. A ACBRA tem mantido contactos com associações brasileiras de criadores e já exportou para aquele país 10 500 doses de sémen da raça bovina Alentejana para o Brasil, “e existem já mais encomendas para novas exportações de material genético”.
Quanto aos principais obstáculos, os responsáveis destacam a legislação. “Nos últimos anos tem-se verificado uma alteração das regras legais para que seja possível a criação de bovinos. Estas têm causado grandes dificuldades de adaptação aos produtores, pois por norma são regras Europeias que são transcritas para a realidade portuguesa, na qual não teriam enquadramento direto, pois trata-se de regras feitas para países onde o sistema de produção é bastante diferente do praticado em Portugal”, diz o secretário técnico da ACBRA. E Fátima Veríssimo salienta a “falta de apoio que as raças exóticas (como a raça Limousine é denominada) recebem por parte da MAMOT/DGAV – Direção-Geral de Alimentação e Veterinária e à enorme diversidade de condições nas diversas explorações de norte a sul de Portugal continental e também nos Açores, algumas delas ainda pouco adaptadas à criação de animais de excelência”. Todas as associações têm programas de melhoramento genético ou de controlo da performance, de forma ajudar os criadores a conseguirem melhores animais.
“UM BOM MANEIO REPRODUTIVO É A BASE DA RENTABILIDADE DOS EFETIVOS”
Quais as principais alterações no maneio reprodutivo de bovinos de carne em Portugal nos últimos dez anos?
Maior preocupação da parte dos veterinários e maior sensibilização dos produtores para perceberem que um bom maneio reprodutivo é a base da rentabilidade dos efetivos a par de um bom maneio alimentar – porém ainda há um longo caminho a percorrer. Os médicos veterinários têm que estar preparados para intervirem e esclarecerem os produtores.
Porque ocorreram estas mudanças?
Pela conjuntura económica e maior investimento em bovinos de carne.
Os criadores adaptaram-se bem às alterações?
Nem sempre. Tudo leva o seu tempo, porém se entenderem que só obtêm benefícios com uma boa gestão reprodutiva vão ter mais crias e finalmente aumentar a rentabilidade da sua exploração.
Quais os principais problemas/obstáculos?
Falta de comunicação entre todos os intervenientes, constrangimentos económicos e um mercado instável e muito feito a efeitos externos.
Os programas de melhoramento genético que a maioria das associações de criadores levou a cabo tiveram bons resultados? Quais as principais melhorias?
Melhores animais, melhores índices de conversão e finalmente carcaças ou animais mais fáceis de vender pela sua qualidade.
Artigo em colaboração com a revista VETERINÁRIA ATUAL