Luís Pessoa é um jovem agricultor de Cantanhede que, em 2012, decidiu avançar com um projeto ProDeR para Plantas Aromáticas e Medicinais (PAM) biológicas. Os cogumelos vieram depois, em complemento, e o objetivo é agora associar-se a outros produtores da região e criar um sistema biodiverso e biodinâmico, inserido numa agricultura de caráter sustentável. Um apicultor será o primeiro parceiro.
“Temos uma grande falta de associativismo na agricultura nacional, que tenho constatado na minha atividade de prestação de serviços agroflorestais. Por isso, procuro criar um sistema de cooperação sustentável, associando-me a outros produtores da região”, adianta Luís Pessoa.
O jovem agricultor considera que, aos poucos, o homem e a natureza se foram dissociando, entrando em confrontação. E o resultado dessa crescente confrontação foi uma progressiva destruição do solo, alteração dos ciclos biológicos, diminuição da diversidade, perda da qualidade dos produtos, contaminações de água, do solo, dos alimentos e um encarecimento contínuo da produção.
Por isso, decidiu criar a ecogrow – biodynamic systems com o objetivo de reestabelecer esses laços de compreensão entre o homem e a natureza. “Criada a partir de uma conceptualização obstinada por toda a essência da natureza, o objetivo partiu por conceber um sistema biodinâmico capaz de responder a um mercado exigente no que concerne a produtos inovadores e provenientes de um sistema ecologicamente sustentável”, explica o produtor.
O projeto, que apresentou em 2012, apontava para “a produção de ervas aromáticas, condimentares e medicinais numa área total de 2,20 hectares, para venda de ervas frescas, secas, plantas em vaso e, futuramente, óleos essenciais, sendo que o investimento total era de 90 000 euros e conseguiu um apoio de 50%, por parte do ProDeR + um prémio de instalação de 30 000 euros”, explica Luís Pessoa à VIDA RURAL, salientando que “falta realizar cerca de 50% da operação, com prazo de conclusão a 31 de maio do presente ano”.
No caso da produção de spawn/micélio e de fardos de produção de cogumelos, o investimento (cerca de 6000 euros + aluguer mensal de espaço) para a construção do laboratório, foi todo proveniente de capital próprio.
PAM têm grande potencial
O agricultor adianta que ao escolher as PAM o objetivo era demonstrar que as ervas aromáticas “para além de um excelente recurso gastronómico, são um produto necessário ao bem-estar humano pelo facto de possuírem propriedades terapêutico-medicinais”. Luís Pessoa adianta ainda que pretende também “potenciar a produção de PAM, como fonte de emprego, de desenvolvimento sustentável e de diversificação económica do meio rural, num contexto de agricultura sustentável”, por isso dá também formações e workshops sobre PAM.
A produção, ao ar livre e em estufa, faz-se em terrenos arrendados, no concelho de Cantanhede já que o jovem agricultor possui apenas terras de pequena dimensão. Ao ar livre estão, entre outras, “as quatro variedades de hortelã e os diversos tomilhos e no terreno em frente vai estar a alfazema, bem como as cerca de 100 colmeias do produtor João Gomes, que deverão ser instaladas agora em março, e que será o primeiro parceiro do projeto”, diz-nos Luís Pessoa.
Na estufa, que foi muito danificada no temporal de 19 de janeiro de 2013 e teve de ser reconstruída, o agricultor possui cerca de 15 000 plantas destinadas à plantação de 2014, entre outras plantas (adultas em vaso ou em alvéolos de germinação) para venda ao público em geral. Comercializa ainda ervas secas para infusões (chás), inalação de vapores e aromoterapia.
No âmbito do projeto, falta ainda a construção do armazém e a aquisição do secador das ervas, adianta o produtor. A secagem da produção de 2013 foi realizada ao natural, num espaço limpo e seco que o agricultor tem noutro local.
Para a produção das cerca de dez ervas aromáticas diferentes Luís Pessoa garante que apenas coloca 20 gramas de composto biológico na cova de plantação e que não realiza mais adubações
Em produção estão desde quatro variedades de hortelã e várias de tomilho (limão, bela-luz, etc.), alfazema, limonete/lúcia-lima, erva-príncipe, erva-cidreira, malva-comum, passando por poejo, manjericão, manjerona, beldroega, alecrim, orégão, salsa e absinto.
Fonte de rendimento ecologicamente sustentável
Quanto à produção de cogumelos, Luís Pessoa afirma que pretende “incentivar a produção de cogumelos como um recurso gastronómico com inúmeras características terapêutico-medicinais e demonstrar a importância dos recursos micológicos como parte integrante dos ecossistemas e como fonte de rendimento ecologicamente sustentável”. Neste âmbito, organiza workshops para todos os interessados no cultivo de cogumelos.
A produção de spawn/micélio da ecogrow é feita em laboratório próprio com ambiente esterilizado, com auxílio de uma câmara de fluxo laminar, estufa, autoclave, etc. Por sua vez, a produção dos cogumelos é realizada noutra sala separada e com ventilação, humidade e temperatura controlada.
O destinatário é o consumidor final que pretende cultivar, ele próprio, cogumelos, em menor ou maior quantidade, pequenas empresas de produção de cogumelos (projetos ProDeR) e restaurantes. Assim, o produtor vende cogumelos frescos, fardos de produção, micélio/spawn em grão e culturas virgens (shitake, Pleurotus, Agrocybe, etc.), para além de cogumelos silvestres frescos (Boletus, Cantharellus, Hydnum repandum, Lactarius deliciosus, Macrolepiota procera).
Plantas micorrizadas
Sempre à procura de formas de produção e produtos inovadores, o produtor decidiu também avançar com a micorrização de plantas, ou seja a associação de um fungo a uma planta, estimulando uma relação de simbiose, pois “o fungo fornece nutrientes à planta que lhe dá amido”.
De acordo com Luís Pessoa, a micorrização “tem vários objetivos, como a melhoria geral do desenvolvimento da planta, já que as plantas ficam mais resistentes a fungos patogénicos, pragas e doenças, além de ajudar na prevenção do stress hídrico e nutritivo”.
Mas, o produtor frisa que, essencialmente, “o que se procura com a micorrização é conseguir uma dupla e/ou tripla produção num povoamento florestal, obtendo cogumelos, frutos e madeira. Por exemplo, num povoamento de pinheiro manso micorrizado com Lactarius deliciosus, obtém-se pinhão, madeira/lenha e cogumelos”.
A ecogrow possui diversas plantas micorrizadas e “o desenvolvimento das mesmas é 33% a 50% de uma planta em condições normais”, garante o agricultor, acrescentando que “a utilização/gestão de povoamentos micorrizados, já se pratica em Espanha há mais de uma década e é uma das práticas florestais com grande relevância para os ecossistemas naturais”.
Temporal causou prejuízo nas PAM
“Em 2013, as vendas de plantas aromáticas ficaram muito aquém das expetativas, devido à tempestade de 19 de janeiro que destruiu a estufa e grande parte das plantas. Outras condicionantes foram os encharcamentos do terreno e o verão demasiado quente, resultando em perdas não previstas. Além de que os roubos e ações de vandalismo continuam a ser uma constante no local. Depois de tudo, 2014 só poderá ser melhor”, afirma Luís Pessoa.
Já no caso dos cogumelos, o produtor salienta que “ao contrário das aromáticas, as vendas dos fardos de cogumelos superaram as expetativas. Venderam-se acima de 300 fardos de produção de cogumelos de vários tamanhos e de diferentes espécies. Também se retiraram boas receitas do spawn”.
Artigo publicado na edição de março de 2014 da revista VIDA RURAL